Sócrates não será demitido pelo presidente da República, que tem uma eleição pela frente; nem pelo Parlamento, porque o PSD não tem líder; nem pelo Povo, que acabou de o reeleger e tem melhores coisas que fazer. Se não me engano, é mais ou menos desta amálgama que se faz um pântano
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1. Um país que tem um primeiro-ministro a quem chamam mentiroso, primeiro no Parlamento, depois em manchetes nos jornais, não é um país politicamente saudável. Porque num país politicamente saudável, aconteceria uma de três coisas: o primeiro-ministro não era mentiroso e os deputados e jornalistas que o injuriaram seriam ridicularizados; o primeiro-ministro era apanhado a mentir e demitia-se; o primeiro-ministro era demitido por ser mentiroso. Como Portugal não é um país politicamente saudável, nada disto acontece. Não sendo mentiroso, José Sócrates não considera importante manter o seu carácter intacto, ou já não tem força anímica para o tentar. Sendo mentiroso, demonstrou outras vezes ter couraça e teimosia suficientes para se manter no cargo, pelo que jamais se demitirá. E, finalmente, não será demitido, nem pelo presidente da República, que teme os efeitos dessa decisão quando tem uma eleição pela frente; nem pela Assembleia da República, porque o PSD anda à procura de líder; nem pelo Povo, porque fomos chamados a votar três vezes no espaço de poucos meses, uma delas para o reeleger, e temos melhores coisas que fazer. Se não me engano, é mais ou menos desta amálgama que se faz um pântano.
2. O PSD é o partido que alterna com o PS no poder. Vai cheirando a fim de festa, não faltam candidatos à liderança. A procissão vai no adro, os perfis dos candidatos são incompletos e certamente incorrectos, mas cabem na crónica. Paulo Rangel representa o papel do iluminado europeu que regressa para provocar a "Ruptura" e ventilar a democracia asfixiada que denunciou em Estrasburgo. Nas palavras elegantes de Renato Sampaio, líder do PS Porto, um "medíocre, pigmeu e europeísta". Os principais apoiantes de Paulo Rangel têm sido, aliás, os socialistas. Para além dos mimos já citados, também José Sócrates o acusa de "fazer carreira política com base no radicalismo". E nos dias que correm, ser o único candidato do PSD que merece um comentário do líder do PS é quase um certificado de garantia. Pedro Passos Coelho é uma espécie de lobo com pele de cordeiro, de palavra e imagem mansas, mas incisivos politicamente afiados. Anda há dois anos em campanha mas desconfia-se que poucos devem saber o que quer "Mudar". Mas dizem que é, dos três candidatos, o que melhor controla o aparelho partidário. É quando se percebe que há coisas que nunca mudam. E uma delas é a tese que diz que, para ser eleito líder do PSD, é preciso controlar os sindicatos de voto. José Pedro Aguiar Branco faz lembrar a figura da velha raposa. A sua postura, amigável sem euforia, sorriso sem gargalhada, remete para os anúncios do cobrador do fraque, que presumimos discreto mas eficaz. Não tem muitos amigos, mas consegue "Unir" até os inimigos. Ou seja, terá sempre muita gente à sua volta mas não terá muito entusiasmo.