Foi bonita a festa da luta, no sábado. Foi única. Isto é, irrepetível. Nunca uma manifestação pôde ser presa tão fácil de grupos despropositados ou mesmo provocadores.
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Não aconteceu no sábado - duvido que não aconteça num segundo evento lançado da maneira como este foi. Um desfile é um empreendimento complicado, que envolve alguma logística e gente preparada para enquadrar a marcha e dissuadir a provocação. A espontaneidade é linda - quando tudo corre bem. Mas espontaneamente nascem, lado a lado, flores - e ervas daninhas. E, na política, estas não são fruto do acaso - são plantadas.
Quem não tem estruturas para enquadrar um desfile de rua, faz melhor se marcar um local de concentração, montar palco e instalação sonora que possa controlar - e abrir ali a festa da luta. Sem aventuras potencialmente trágicas.
E agora a seguir? Como dar sentido a toda a energia da revolta que se manifestou de forma tão diferente pelas ruas de Portugal? Dois factores sobressaíram na jornada de sábado: a mobilização por rede social - e a pluralidade de opções políticas e ideológicas para o mesmo grito contra a injustiça.
No momento de saber «o que querem mesmo» os jovens que se manifestaram chegar-se-á à conclusão de que não haverá consenso. E ainda bem. Porque não é tempo de sonhar utopicamente - e perigosamente - com uma «força nova» agregadora da ideia. Pelo contrário, há que aproveitar o que une na diversidade. Isto significa que não se trata de criar uma organização nova, mas resgatar as existentes e que nasceram como focos de esperança e mobilização: os partidos e os sindicatos. Sucedeu, nas últimas décadas, que foram usurpados pelas burocracias e redes de interesse, por falta de vigilância cívica dos militantes. É preciso que haja a perseverança de entrar nos partidos e nos sindicatos e devolvê-los ao seu destino original. O uso de redes sociais pode até permitir a conjugação de esforços interpartidários de exigência e vigilância, porque mais importante do que a lógica de partido é a realidade da indignação que irmana pessoas de opções políticas diferentes, como se viu.
Pluralidade e rede - pode ser a consigna. Uma espécie de cumplicidade entre militantes de partidos diferentes para não os deixar nas mãos de usurpadores instalados.
Pluralidade, rede - e internacionalização. Porque a cumplicidade da revolta tem de chegar a outros lados onde o problema se repete e onde acrescem, além dos egoísmos partidários, os nacionais.
Não é fácil. Mas foi o que me coube numa folha A4.
