De um dia para o outro a aparentemente longínqua Nigéria tomou conta da volátil agenda mediática internacional. Não é a primeira vez que os olhos do Mundo se voltam para aquela turbulenta zona de África. E quase sempre pelas mesmas (e piores) razões. O país exibe a melhor performance económica de todo o continente - é o principal produtor africano de petróleo -, e a sua pujança coloca--o à frente de referências como a África do Sul. Acontece que a Nigéria é também, e talvez por isso, um país onde reina a corrupção e o enriquecimento desmesurado de uma elite bem distante da realidade do Estado, onde ir à escola é um luxo ao alcance de muito poucos, os cuidados mais elementares de saúde são uma miragem e onde comer não é uma certeza do quotidiano. Preocupantes indicadores socioeconómicos a que se juntam outros: a Nigéria é o país mais habitado de África, com 60% da população situada na faixa etária abaixo dos 25 anos e esmagadoramente desempregada.
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O cenário não é animador e é aproveitado pelos emergentes grupos radicais islâmicos, como o sanguinário Boko Haram, que sabem ter aqui terreno fértil para a captação de militantes disponíveis a lutar pelas suas aberrantes causas justificadas por uma particular interpretação do Corão. O infame rapto e ameaça de venda de centenas de meninas nigerianas era, por tudo isto, previsível. O estado de Borno, no Nordeste, onde opera o Boko Haram, é política e economicamente distante da capital, Abuja. Aqui, os burocratas do regime sabem qual tem sido o movimento da população que anseia uma vida melhor: ruma a norte onde a educação nas escolas corânicas é gratuita, ainda que quem delas sai continue com o futuro adiado. Não tem emprego e vê, tantas e tantas vezes, como única saída a militância radical. O poder nigeriano sabe bem disso. A comunidade internacional também, mas parece que não aprendeu nada com o recente caso do Mali. Será por serem países distantes? São menos do que parece.
Portugal, por exemplo, depende, e muito, das importações energéticas nigerianas. Entre 2000 e 2011, de acordo com dados da Direção-Geral de Energia e Geologia, a Nigéria foi o principal fornecedor nacional de petróleo bruto (18,1%) contra, por exemplo, 8,3% proveniente da Argélia, outro importante parceiro económico português em matéria energética. Esta dependência, conjugada com os novos cenários geopolíticos, aproxima-nos bem mais do que todos imaginamos da situação que se vive no país liderado por Goodluck Jonathan e ameaça mexer nas nossas vidas mais do que poderíamos supor. Isto, para além da inaceitável condição das meninas sequestradas e ameaçadas pelos rebeldes, cuja libertação devemos exigir sem quaisquer hesitações. Porque, em matéria de direitos humanos, não pode haver países longínquos.