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À exceção de algumas vozes mais inquietas, às vezes tidas como Cassandras, a questão da onda terrorista que assola a Europa parece coisa estrangeira aos olhos da maioria dos nossos concidadãos. Deteto mesmo, passada a solidariedade de regra para com as vítimas, algum saloio contentamento mercantilista, pelo facto de continuarmos a consagrar-nos como beneficiário turístico da confusão instalada a leste deste "luso-paraíso".
O PM português, que de outras andanças governativas conhece bem este tema, disse algo que alguns fingiram não ter percebido: que por cada ataque terrorista que tem lugar, muitos outros são evitados. É que, não fora o trabalho policial e de investigação realizado, a situação seria hoje muitíssimo mais grave, face à complexa e insidiosa natureza do radicalismo islâmico
A nossa segurança como país não pode basear-se na ideia de que a perifericidade geográfica nos protege ou de que o rácio religioso interno nos conforta. A segurança está sempre longe de ser um dado adquirido: uma bomba num aeroporto ou numa escola é passível de ocorrer entre nós, face a esta guerra de fins que não olha a meios. De um dia para o outro, a leitura de interesses dos radicais pode vir a enviesar-se em nosso detrimento - e então passará a ser demasiado tarde prevenir. E o risco de isto acontecer é tanto maior quanto as nossas fragilidades securitárias forem mais evidentes.
Neste esforço de proteção, desempenham hoje um papel fundamental os serviços de informação. Por isso, e atento o caráter transfronteiriço dos grupos que nos trazem ameaças, uma cooperação eficaz entre eles é essencial.
Ora é sabido que Portugal, neste domínio, já tem revelado grandes fragilidades, como o demonstra o facto de terem conseguido ascender a lugares de topo dessas estruturas verdadeiros "cowboys", cujas aventuras afetaram a credibilidade dos serviços, retraindo a abertura à partilha informativa por parte dos congéneres mais relevantes.
Espero que o senhor presidente da República, que transmite sinais de se não querer furtar a dar às grandes questões de Estado uma atenção com público destaque, possa também induzir em todos os agentes políticos um forte sentido de responsabilidade neste âmbito específico.
Em particular, importa garantir que os nossos serviços de informação venham cada vez mais a estar preservados das lutas de poder, nomeadamente no quadro da patusca conflitualidade entre as sensibilidades dos ritos organizados, os quais, por um insondável mistério, cuja lógica sempre me escapou, parece terem obtido, desde há muito, um direito natural de tutela e influência neste setor.
*EMBAIXADOR