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Não pretendendo teorizar sobre a matéria triste dos incêndios que nos têm massacrado porque tenho consciência das minhas sérias limitações na matéria em causa, vou mantendo um afastamento prudente ao massacre mediático que vive da amplificação da desgraça, no contraponto à tentativa de esterilização da mensagem pela autoridade que gere a Proteção Civil. No meio deste frenesim até se afirma que um dos motivos para a desorganização visível resulta do desaparecimento dos governos civis! Aqui vale a pena refletir um pouco sobre esta questão, porque a mesma não é de somenos, pelo contrário, pode ser uma condicionante do desenvolvimento.
A organização centenária do país em distritos, com quase dois séculos, resultado de uma importante reforma do território à época, que implicou a extinção de quase 500 concelhos e a criação da estrutura distrital, não foi até hoje objeto de um acerto e articulação final com a realidade da nossa integração na União Europeia, que deu origem aos novos conceitos e designações de região, NUT II, e comunidades intermunicipais e áreas metropolitanas, NUT III. Era por isso difícil perceber em 2011 o porquê da permanência de um representante do Governo nos distritos, face ao que eram já então as competências residuais dos governos civis. Nos últimos 30 anos, convivemos com estas duas realidades, que se sobrepõem em muitos casos com entidades que no território gerem, por exemplo, serviços como a proteção civil, justiça, segurança social ou saúde, sobretudo porque não coincidem com os meios e competências que, entretanto, se pretendem implementar na nova realidade organizacional.
Uma reflexão séria e aprofundada sobre o que deve ser o papel das comunidades intermunicipais e áreas metropolitanas é um imperativo dos próximos tempos, porque podemos ter aqui algumas das respostas e soluções para a melhoria da atuação do Estado em setores como os atrás referidos, que marcam e afetam a nossa relação de confiança com os vários níveis de poder. Que não seja o facto de as eleições legislativas ainda estarem penduradas no mapa distrital e nas suas estruturas partidárias a impedir esta reforma. Porque seguramente que o Alto Minho, Douro, Trás-os-Montes, Alto Tâmega, Tâmega e Sousa, Cávado, Ave e Porto, dizem hoje muito mais às populações e organizações sobre o território do que os cinco distritos que ainda interferem na sua divisão administrativa.
PROF. CATEDRÁTICO, VICE-REITOR DA UTAD