<p>A TNS Worldpanel, uma empresa que realiza com regularidade estudos de mercado para avaliar os factores que fazem movimentar o consumo dos portugueses, libertou ontem um trabalho que, na sua essência, parece apontar um problema sério: aprendemos pouco (ou, pelo menos, não aprendemos o suficiente) com a crise económica e financeira que abalou meio-mundo e deixou outro meio à beirinha do precipício. É uma pena, porque, deste modo, será muito mais difícil sairmos do turbilhão em que nos encontramos. </p>
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Em traço grosso, o estudo (ver conclusões em pormenor na página seis) mostra que a alma dos indígenas está hoje muito menos estremunhada do que há uns meses. Exemplo um: o consumo de marcas brancas continua a crescer, mas a um ritmo mais ligeiro, o que mostra a disposição dos consumidores em trocarem estes produtos por outros mais caros. Não fosse a inflação permanecer negativa e este facto seria hoje bastante mais notório. Exemplo dois: já pouca gente se dá ao trabalho de ir a Espanha encher o depósito do carro, não obstante o preço da gasolina e do gasóleo estar a crescer, em Portugal, há umas semanas (na ordem dos 25%, em média). Exemplo três: os comerciantes continuam a dar conta da crise aguda que os aflige, mas o trabalho da TNS refere um crescimento na aquisição de roupa...
Enfim, apesar de haver uma percentagem significativa de pessoas a garantir poupar mais não por sentir reais dificuldades de aquisição de bens e serviços, mas porque se deixou tomar pelo efeito psicológico da crise, o certo é que já destapámos a tampa da panela, libertando-nos assim do insuportável peso que a crise colocara nos nossos ombros.
Verdade que para isso contribuiu o discurso optimista que dá por (quase) encerrados os tempos verdadeiramente difíceis. Verdade que o alívio dos juros e os aumentos salariais reais de que beneficiou a Função Pública ajudaram a fechar os meses de muitas famílias sem a necessidade de contar tostão a tostão. Verdade que as estatísticas mostram melhorias. Tudo isso é verdade. Mas nada disso é suficientemente consistente para decretarmos uma nova e melhor vida no novo ano que aí vem.
Antes pelo contrário: o regresso do défice das contas públicas a níveis aceitáveis, o controlo do endividamento externo, a capitalização das pequenas e médias empresas, a luta sem tréguas contra o desemprego, a captação de investimento directo estrangeiro e uma multiplicidade de outras tarefas com idêntico calibre não permitem grandes folgas. Não permitem nenhuma folga. É bom que estejamos conscientes disso. Por um motivo muito prosaico: como nos últimos anos temos acelerado ferozmente contra a parede, não tarda e a parede aparece...