O Governo não se portou mal quando a epidemia cá chegou. As "medidas" suportaram-se disciplinada e antecipadamente. Em Maio começaram a aligeirar-se as coisas e a reabrir a economia possível.
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Não houve planos de controlo ou de avaliação permanente dos resultados desses retornos, mesmo em versão mitigada, e em Julho passou-se por alguns momentos de susto. Importante, mesmo, era induzir a "normalidade". E, com a "normalidade" e o calendário, veio a distensão das férias. Praticamente ninguém abdicou delas naquele sentido de ter forçosamente de sair de um lado - a cidade - para se exibir noutro, em geral a praia, o campo, a montanha, o regato, o restaurante, a esplanada. Ainda antes de a época balnear estar oficialmente aberta, já o regime se exibia dentro de água e sobre o areal a comer bolas de Berlim. Entretanto, regressado dessas amenidades, o Governo reparou que vinha aí o último quadrimestre.
Sem vestígio de ideias ou ambição, a não ser um novo "estado de contingência" anunciado com 15 dias de antecedência, e como a realidade não tira férias, o embate exigiu do primeiro-ministro rápidas acções de "agiprop" que se traduziram fundamentalmente em entrevistas (faltam as televisivas) e em bater na tecla, ainda vazia, da vacina. Acossado pelos desenvolvimentos sempre imprevistos da pandemia, Costa agarra-se aos putativos milhões europeus de 2021, no mesmo plano "ideal" da vacina, e à politiquice chantagista e anti-institucional em que ele é especialista como se viu mais recentemente no caso dos professores. Afirmou, noutra ocasião, que não era Guterres nem Sócrates. Na sua inconfundível língua de pau, estava a informar que não contassem com ele para desbaratar o glorioso Governo minoritário improvisado a que preside. A pretexto do Orçamento do Estado, ameaçou o país com uma crise. A pretexto das presidenciais, ameaçou os seus ministros com o respeitinho. E a pretexto de uma bojarda tornada conspícua, inventou uma reunião com médicos que não serviu para nada, continuando 18 mortos a boiar no mar da indiferença destes lamentáveis jogos florais.
O presidente da República reparou, tomou e deu publicamente nota, duas vezes seguidas, que tinha dado pela pantomima. Não foi por falta de aviso. "Desde a I República que não aparecia um cacique da envergadura do dr. Costa, pronto a meter o país no fundo por vaidade pessoal ou conveniências partidárias", escreveu Vasco Pulido Valente em Setembro de 2015. Beberam pelo gargalo, agora têm de comprar a garrafa com a zurrapa lá dentro.
O autor escreve segundo a antiga ortografia
*Jurista