A pior das silly seasons...

Mal ou bem, estamos de férias. Não há escolas e quem ainda está empregado tem o merecido gozo de alguns dias de descanso. A grande maioria não sabe o que lhe vai acontecer, mas também não pode fazer nada por agora. O tempo está, por esta via, congelado. Tristemente congelado, porque não vemos praias cheias nem ouvimos falar de festas da gente do jet set. E, acreditem ou não, pela primeira vez dá-me medo esta ausência de futilidade estival.

Em overlap está o tempo político. E também este parece ter gelificado.

A mais expressiva ilustração deste fenómeno foi o debate parlamentar sobre o estado da nação.

Por qualquer razão que um observador externo não consegue descortinar, ao bordo do abismo, António Costa afirmou com tédio o controlo da situação sanitária e anunciou sem entusiasmo o pacote taumatúrgico de fundos europeus.

Seguiu-se-lhe um arremedo de oposição à esquerda e à direita a fazer lembrar as entrevistas de RAP a personalidades políticas que de tão fluidas só podem ser preparadas.

Afinal, a propósito de quê vem o líder do maior partido da oposição esgrimir os leilões de hidrogénio como principal arma de arremesso contra uma governação que tem de lidar com uma quebra do PIB na ordem dos 10% e um desemprego potencialmente devastador?

E porque é que, como quase sempre desde o início desta legislatura, não houve uma inquietação que se levantasse a mais nenhum dos 70 membros que compõem este Executivo? O primeiro-ministro não só protagoniza a ação governativa como simplesmente iliba, por omissão, todos os seus colegas de governação.

Debaixo do gelo fino, António Costa estanhou o sorriso, Rui Rio o franzir de sobrolho e Catarina Martins o olhar irónico sobre o voto amoroso de um marido infiel.

E, no entanto, o maremoto pressente-se. Ruge em surdina e acabará por desabar sobre as vidas momentaneamente pacatas do povo.

Marcelo encarregar-se-à de quebrar o gelo fino que, por agora, parece paralisar o tempo político.

*Analista financeira