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A taxa de desemprego em Portugal tem vindo a registar números considerados inimagináveis ainda há pouco tempo. Nenhuma previsão admitia os dados preocupantes que agora foram revelados, com a agravante de ninguém ter ideia de quando esta curva ascendente deixará de subir. E se quase um milhão de desempregados é assustador, não há adjetivos para qualificar os 40% de jovens que se encontram nessa situação. Mas mais. A maioria destes jovens não tem qualquer perspetiva de alterar a sua situação a médio prazo, face à contração da economia nacional. E, como sobejamente tem sido dito, cerca de 500 mil dos de-sempregados não recebem qualquer subsídio.
Não admira, por isso, que muitos deles não se resignem a cruzar os braços e a esperar por melhores dias e tenham procurado noutros países aquilo que aqui não conseguem. Alertados pelas desestimulantes palavras do primeiro-ministro para quem a solução que lhes propunha era a emigração, milhares desses de-sempregados partiram à procura de uma oportunidade para uma vida digna. A grande maioria saiu sem nada assegurado, verdadeiramente à aventura. As autoridades suíças, por exemplo, já vieram tornar pública a sua preocupação perante o elevado número de portugueses que ali têm recentemente procurado acolhimento.
Na União Europeia, apesar de tudo, há regras comuns que os estados--membros são obrigados a respeitar. Mas noutras partes do Mundo, a situação pode tornar-se bem mais difícil, a ponto de originar potenciais conflitos entre o nosso país e aquele onde se procura trabalho.
É o caso de Moçambique. País imenso, com cerca de 800 mil km2 e apenas 20 milhões de habitantes, Moçambique ainda é, hoje, um dos mais pobres países do Mundo. Com um produto interno bruto, por pessoa, de apenas 600 dólares, uma esperança de vida de cerca de 50 anos e com 80% da população analfabeta, o país é ainda beneficiário de uma forte ajuda internacional.
Mas as coisas estão a mudar aceleradamente. No ano passado, registou um crescimento de 7,5% e neste ano prevê-se que cresça 8,5%.
As perspetivas a médio prazo são impressionantes. As recentes descobertas de gás na bacia do Rovuma, onde operam algumas das mais importantes companhias petrolíferas, colocam-no, para já, como o quarto país do Mundo com maiores reservas de gás natural. As reservas de carvão posicionam-no entre os 10 maiores e aqui começaram a operar as duas maiores companhias de mineração de todo o Mundo.
Portugal não tem ficado alheio às oportunidades que aqui se abrem e na área da energia, da pasta para papel, do imobiliário, das infraestruturas, algumas das mais importantes empresas nacionais posicionaram-se com investimento muito significativo. As exportações portuguesas triplicaram em quatro anos.
Sendo um país tranquilo com uma carência enorme de mão de obra qualificada, não admira que Moçambique seja olhado, na crise que vivemos, como um novo Brasil. Cada vez mais portugueses imaginam poder encontrar ali as oportunidades que em Portugal não vislumbram. E vá de juntar uns trapos, comprar uma passagem, conseguir um visto de turista e partir à aventura. Só que muito rapidamente a situação tomou proporções inquietantes. Sem apoios, sem visto para poderem trabalhar e com o afloramento de alguma contestação da população local que se diz discriminada face aos trabalhadores portugueses, as autoridades moçambicanas apertaram a vigilância. E o facto é que não há agora dia em que não sejam recambiadas para Portugal pessoas que sonharam, por breve tempo, com dias melhores. Regressam mais pobres do que partiram.
Ora esta situação é intolerável. O Governo português, que há demasiado tempo não consegue estancar a hemorragia do desemprego e que tem como única solução a emigração dos seus trabalhadores, tem o dever, melhor, a obrigação de encontrar no domínio das relações bilaterais forma de evitar a humilhação por que passam muitos cidadãos de boa fé. É, também, a imagem do nosso país que é afetada, com visível impacto negativo nas empresas portuguesas que legitimamente operam naquele país.
Moçambique precisa de mão de obra qualificada. Portugal tem boas relações com a antiga colónia e precisa de participar no surto de desenvolvimento que agora começa. Por que espera, então, o Governo?
PS - À hora que escrevo estas linhas, não tiveram ainda início as manifestações previstas. O que espero e desejo é que atinjam os objetivos que se propõem.