Fazemos parte de um teatro de sombras: um emaranhado nebuloso de que não nos conseguimos libertar e que nos faz coletivamente responsáveis por mais de 100 mortos.
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Dito isto, ainda há prioridades e ainda há quem tenha a responsabilidade de nos representar e de dar com a ponta do novelo: o presidente da República, o primeiro-ministro e os ministros envolvidos - e não só a ministra da Administração Interna.
Para quem vê de fora, como eu, parece que António Costa não pôde garantir que tudo foi feito para evitar mais esta tragédia. E não resolve querer convencer os portugueses de que o primeiro dia do resto das nossas vidas começa no Conselho de Ministros de sábado. De resto, não se percebe porque não terá arriscado um discurso mais corajoso e mais sincero. Afinal, o PCP e o BE estão comprometidos. O PSD está sem liderança e Assunção Cristas, embora rápida, não tem ainda condições de ser eficaz.
O povo estaria com o primeiro-ministro se, arriscando passar pelo terrível crivo da Comunicação Social mais tradicional e das pavorosas redes, pedisse desculpa, assumisse que não percebe o que se passa nem como se resolve de repente e, sobretudo, se comprometesse a pessoalmente liderar a descoberta da ponta deste novelo que, como qualquer outro, há de poder desenrolar-se.
Há momentos em que não devemos, pura e simplesmente, deixar de seguir a nossa intuição em vez de aceitar disciplinadamente os cínicos planos de contenção de danos injetados pela comunicação de crise.
O presidente da República teve, aliás, neste erro de António Costa, o maior fundamento para o seu discurso de Oliveira de Frades.
Porque, em rigor, o sr. presidente da República já poderia ter colocado em cima da mesa todas as exigências que fez neste seu discurso há quatro meses. Os 64 mortos de Pedrógão foram e são razão mais do que suficiente.
Por isso, para mim, a uma única coisa realmente importante desta intervenção foi o compromisso do presidente da República em se empenhar, como presidente e como pessoa, no encontro de um caminho para a resolução deste flagelo, até final do seu mandato.
Sei que pode, se quiser, encontrar/fazer encontrar o fio deste terrível emaranhado.
Prometeu-o e faço confiança de que honrará essa promessa.
ANALISTA FINANCEIRA