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O contínuo e excessivo fornecimento de informação sobre um tema pode gerar situações de sobrecarga informativa, que dificultam o seu processamento de forma racional e tendem por isso a criar zonas de interceção e conflito entre o que é a realidade dos factos e a forma como os mesmos são percecionados.
Tentando usar um exemplo simples e cientificamente provado, temos o facto de a segurança alimentar nunca ter sido tão elevada como nos dias de hoje, em especial pelo esforço permanente no seu controlo. No entanto, fruto da intensa e difusa campanha informativa que qualquer incidente provoca, a perceção do seu contrário é generalizada em muitos estratos da população, sobretudo através do mito de que antigamente tudo era mais puro e mais seguro.
Se abordo esta questão é porque nas últimas semanas somos bombardeados por notícias de índole diversa, todas centradas na guerrilha política permanente, em que as fontes são tantas e tão diversas que temo poder não estar a ter a melhor perceção da realidade.
A Caixa Geral de Depósitos continua na ordem do dia, começando já a faltar alguma paciência para o cheiro a requentado do dossier. Temos a perceção de que há pessoas responsáveis que terão mentido, faltando agora apurar se a qualidade da prova pode estar na forma de mensagem de telemóvel. Bonita forma de tratar assuntos de Estado, em que aparentemente o próprio presidente da República terá sido informado do seu conteúdo por um dos seus conselheiros!
Para contrariar a tendência mais negativa do tema da caixa, aparece agora a novela relativa à não publicação estatística de transferências para contas sediadas em territórios designados por offshore. Em que o "overload informativo" é total. Se foram os bancos a enviar a informação às Finanças e estas a enviar a lista ao secretário de Estado, as transferências foram ou não controladas? Há ou não territórios como a ilha de Jersey que antes eram e agora já não são offshore, ou seja, antes eram sujeitos a publicação e agora já não? Pelo meio da preocupação do presidente, a insinuação do primeiro-ministro, o ar inquisidor da jovem Mortágua e a postura de defesa do líder da Oposição, vale tudo e mais alguma coisa. Até um jornalista em horário nobre a fazer parecer que aquele dinheiro todo era nosso, dava para pagar os juros da dívida e ainda sobrava algum! Assim é difícil perceber a realidade.
* PROFESSOR CATEDRÁTICO DA UNIVERSIDADE DO PORTO