Era uma vez um monstro chamado preço dos combustíveis. Certo dia, os filhos mais assustadores desse monstro, de seu nome gasóleo e gasolina, atingiram preços terríveis, depois de um ano em que aumentaram mais de 35 vezes.
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O lobo mau da história, garantem os produtores, são os impostos, que consomem 60% do valor final. Não, não, exclama, por sua vez, o Governo. O lobo mau são os avarentos produtores, revendedores e distribuidores, que não querem cortar nas margens de lucro.
Foi então que, do meio da floresta, surgiu outra personagem, chamada transição energética. Veste-se de verde e a esperança do poder executivo é que venha a tornar-se na salvadora da pátria. Mesmo que a realidade seja uma coisa diversa, mesmo que os portugueses não tenham dinheiro para comprar veículos híbridos ou elétricos, e que para muitos o carro seja a única opção de mobilidade, mesmo que as empresas não tenham alternativa ao gasóleo para gerarem valor e pagarem salários.
Mas o Governo que não ia baixar os impostos sobre os combustíveis entretanto encontrou forma de cortar 10 cêntimos por litro. Fê-lo usando o complicador do IVAucher, quando podia ter optado por uma ajuda direta a cada consumidor, como fizeram os franceses. Mas facilitar o processo, arriscamos, provavelmente ficaria mais caro aos cofres públicos. Ainda assim, saúde-se a decisão, na medida em que prevaleceu a força da realidade e não a ideia romântica (embora repleta de bondade) de que o país ia entregar-se nos braços da energia limpa.
Moral desta história nada infantil: não podemos querer dar-nos bem com Deus e o Diabo. Esperam-nos longos meses de preços altos e de dores económicas, talvez com despedimentos e falências. Cabe ao Governo juntar as partes e repartir o esforço por todos. Estado, produtores, revendedores e distribuidores. E cabe à União Europeia, que deu todas as armas ao setor para praticar os preços que bem entende num mercado liberalizado, encontrar respostas concertadas que evitem que a uma crise pandémica desastrosa se some uma crise energética trágica.
*Diretor-adjunto