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Entaipado pela discussão do OE, António Costa apresentou no último debate parlamentar, en passant, as linhas mestras para a modernização do Estado.
Quanto ao Governo, passará a ter força de lei o que o bom senso já devia ter ditado.
O proposto para a modernização da administração pública central é vago e pouco imaginativo.
Já o reforço de competências e legitimidade que se antevê para as CCDR traz uma mudança significativa face ao que hoje temos. Se bem percebi, a presidência das CCDR passará a ser eleita por um colégio de representantes autárquicos, os serviços desconcentrados serão reorganizados à respetiva escala territorial e o seu papel de centros de planeamento e definição de estratégias regionais será reforçado.
Em simultâneo, anuncia-se que as áreas metropolitanas (Lisboa e Porto) serão eleitas diretamente pelas populações e que as autarquias locais serão os destinatários únicos da transferência de competências no caso da maioria das redes dos serviços de proximidade.
No entanto, sr. primeiro-ministro é melhor não se dar ao trabalho se:
- à racionalização dos serviços desconcentrados não corresponder uma efetiva capacidade de iniciativa hoje tolhida por uma total e mesmo indigna dependência das respetivas tutelas centrais;
- às CCDR não se oferecer mais do que uma vaga sensação de conforto institucional face aos colegas eleitos das regiões autónomas das nossas fronteiras com Espanha; ou seja, se os exercícios de coordenação territorial ao nível do planeamento e definição de estratégias não forem concreta e definitivamente levados em conta pela administração central e tutelas governativas;
- o reforço da cooperação intermunicipal não tiver como base uma outra leitura da escala a que devem ser efetivamente descentralizadas as redes de serviços de proximidade; porque a escala correta não é sempre a escala municipal;
- se não perceber que, pelo menos no caso da Região Norte, a distinção da Área Metropolitana do Porto provocada pela alteração da sua legitimação política agravará irreversivelmente a fratura litoral - interior; em Lisboa, agravará a distância com tudo o resto, mas a isso já estamos habituados.
"A força de uma espera só se estanca na corrente*. E só quer a vida cheia quem nunca teve nada". Mas daí a fazer tábua rasa da experiência ou a precipitar soluções imperfeitas, vai um mar de problemas que convinha antecipar.
*Frase da canção de Sérgio Godinho com que António Costa iniciou o seu discurso
ANALISTA FINANCEIRA