A discussão sobre a "reforma do Estado" em Portugal tem-se assemelhado muitas vezes a uma cornucópia de consensos vãos e frustrações endémicas. Estamos genericamente de acordo quanto aos princípios universais da "racionalidade" e "transparência" desse Estado e às suas funções de "coesão territorial" (vindo sempre à tona o "Interior"...), mas temos fracassado há décadas em dar passos concretos na reorganização e democratização deste grande "condomínio".
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Por razões diversas e que muitas vezes a razão desconhece, o Estado que herdamos continua a ser tradicionalmente centralizado, verticalizado e perdulário do potencial do "país real". Por isso, é pouco dado às práticas do diálogo entre políticas e agentes, à prestação de contas e à proximidade e adaptação aos territórios. Mais do que na carência de recursos, é aqui que tem radicado o falhanço do nosso modelo de desenvolvimento.
Neste contexto, deve ser aplaudida com benigna expectativa a medida consagrada pela recente resolução do Conselho de Ministros no sentido do reforço da territorialização do Estado, através da integração dos seus serviços desconcentrados nas comissões de coordenação e desenvolvimento regional (CCDR).
Esta medida não visa nem novas "centralizações", nem uma quimioterapia ou cura de emagrecimento. Visa integrar, dando coerência, inteligência e eficiência à atuação do Estado nas regiões. Não se trata de extinguir a já rarefeita máquina territorial do Estado... Certamente que oportunidades de racionalização não deverão ser descuradas.
Esta reforma territorial do Estado não pode também ser "desnatada", operando uma centralização na capital de funções estratégicas e alijando na periferia guichets anódinos para expediente administrativo. Do mesmo modo, não deve ser reduzido o nível de intervenção dos dirigentes dos organismos regionais, após a sua integração nas CCDR, capacidade que decorre diretamente do seu estatuto público. Importa racionalizar o Estado, mas recusando um modelo empobrecedor da desconcentração.
Este processo é fundamental se quisermos dar um salto qualitativo na atuação dos poderes públicos. Os desafios de hoje - da transição climática e energética, da demografia, da inovação, da digitalização, do envelhecimento e da inclusão - são cada vez mais complexos, exigindo soluções fora das habituais "gavetas" departamentais. Não evoluir na organização do Estado é comprometer o cumprimento desses desafios históricos.
*Presidente da CCDR-N