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"Estudos" mostram o indigenato insatisfeito com praticamente tudo. Queixa-se da habitação, da distribuição da riqueza e dos impostos. Desconfia dos partidos, do Governo, da Assembleia da República e da Igreja. Porque a Igreja entrou na moda mediática pelas piores razões, e os "portugueses" apreciam a moda mediática, seja ela qual for. Paradoxalmente, ou não, o mesmo indigenato confia na polícia (o português médio aprecia muito o respeitinho e ter um paizinho por perto), nas Forças Armadas, nos presidentes das juntas de freguesia (?) e no extraordinário Marcelo. Se Marcelo fosse jogador de bola, era a mesma coisa. Ele é "o" Marcelo, um misto de político e "gajo porreiro". Não é "o" chefe de Estado. Aliás, para o que é, fotógrafo borlista de todos os portugueses, basta. Uma semana depois, este mesmo indigenato, "estudado" de novo pelo grupo Impresa, esqueceu-se daqueles gostos e desgostos. Os partidos, os dois maiores, equivalem-se nas intenções de voto, com um ligeiro avanço do PS. Costa até "recupera" e Montenegro não "capitaliza" os desgostos referidos. Mesmo assim, o Governo é mau e a "avaliação" dos "líderes", à excepção do glorioso Marcelo, não é melhor. Os menos 0,2% que recebe em relação ao "estudo" anterior são "compensados" com os mais 0,2% de Costa. Anulam-se um ao outro, portanto. A "sondagem", evidentemente, é um recado. Cuidado que, com o Chega em 13% e em terceiro lugar, a ominosa direita fica nas mãos de Ventura se quiser governar. "Puxar" pelo PS e pelo Chega é, pois, uma e a mesma coisa. Depois, a tranquilidade de que Costa precisa para continuar a lançar milhões e poeira para os olhos deste indigenato absurdo virá em Julho, com o relatório da comissão da TAP. Já se fala em mudar apenas umas "regras" para os gabinetes - casas de banho onde caibam mais de seis pessoas? Com alguma sorte, talvez nem seja preciso arranjar um Galamba melhor que o actual Galamba porque, famosamente, existe material reciclável. A novela da remodelação é tão estéril como o Governo. Isto para dizer que os "portugueses" entrarão no Verão como adoram: em alegre inconsciência e na consciência disso. Socorro-me de Eduardo Lourenço para terminar (porque era de esquerda, logo insuspeito, e em 1978). "A regra do jogo é a da desdramatização de todos os problemas nacionais", desaparecendo do horizonte "o sujeito de qualquer responsabilização séria pelo estado inalterável, e em vários aspectos, piorado, de um país que de uma vez por todas nós decidimos subtrair ao pouco exaltante ofício de o conhecer, descrever e julgar como ele é".
o autor escreve segundo a antiga ortografia
Jurista