A representação política do Interior
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Em 1998, pediram-me para fazer um estudo sobre o possível modelo de financiamento das regiões administrativas no continente que acabou em livro. A questão que se colocava então, como agora, era a de saber quando se fala em regionalização que modelo se tem em mente. Para tornar as coisas mais claras, distingui dois modelos possíveis de regionalização, um que seria extremamente mau para o país e outro que seria interessante. O primeiro, um modelo redistributivo de regionalização política com significativa autonomia fiscal das regiões, capacidade de endividamento e de pressão junto do poder político nacional e europeu permeável a atividades de rent-seeking de líderes regionais. O segundo, um modelo político-administrativo, com foco nas “vantagens comparativas” regionais, com mais restrições quer ao nível tributário, quer de endividamento, e um enquadramento constitucional da partilha de receitas entre diferentes níveis de governo. Infelizmente continua a falar-se em regionalização sem se perceber que modelo se pretende. Estou convicto de que não vai haver regionalização nas próximas décadas e que, caso existisse, provavelmente se avançaria no mau modelo.
Significa isto que estamos condenados a que não haja reforço da representação política das regiões do Interior do país? Não necessariamente. Apesar de não ser equivalente à regionalização, é possível melhorar a representação política de algumas regiões do Interior com uma alteração do sistema eleitoral.
Nomeadamente ao nível do desenho dos círculos eleitorais, aumentando a escala dos círculos. Em concreto, a agregação de 3 círculos do Alentejo, 2 de Guarda e Viseu, 2 de Vila Real e Bragança. De sete círculos eleitorais passaríamos para três.
O aumento da dimensão dos círculos diminui a disparidade dos círculos, sobretudo se acompanhado da partição dos grandes, em particular de Lisboa e Porto. Cria maior justiça eleitoral minorando o problema que existe em pequenos círculos, em que para muitos cidadãos a opção é entre o “voto útil” num partido em que não se reveem ou o “voto desperdiçado” no partido que apoiam mas que sabem que não vai eleger ninguém. Este dilema não existe para quem vive em Lisboa ou no Porto.
Há cerca de um ano, foi lançado um manifesto pela reforma do sistema eleitoral no sentido de lidar com este problema e com outro. A não possibilidade em Portugal de se votar simultaneamente em partidos e candidatos. O monopólio da ordenação de candidatos eleitos está totalmente nos partidos, ao contrário da esmagadora maioria de países europeus, em que é possível a personalização do voto. O manifesto abre para várias possibilidades de reforma, mas há uma que está a ser trabalhada e que é a mais interessante do ponto de vista da descentralização política: um sistema com dois níveis de círculos. Qualquer um daqueles três círculos plurinominais seria subdividido em três círculos uninominais: o Alentejo, com Beja, Évora e Portalegre; a “Beira Interior”, com Castelo Branco, Guarda e Covilhã; e o Nordeste, com Bragança, Vila Real e Chaves. Ou seja, aumenta a escala sem desaparecer, antes aumentando, a descentralização política. No mesmo território onde havia sete círculos, passaria a haver três regionais e nove uninominais, em que os cidadãos passariam a ter dois votos, no seu candidato e na lista partidária. Ao mesmo tempo haveria uma partição dos grandes círculos. A reforma do sistema eleitoral é difícil, mas com um forte impulso dos cidadãos será possível. A efetivar-se, aumentaria o peso político das regiões do interior. O manifesto, os subscritores e o projeto de reforma do sistema eleitoral encontram-se AQUI