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Desde a Antiguidade à "Face Oculta", "corrupção" significa aquilo que está fundamentalmente quebrado, da confiança à honra. Entre nós, os casos divulgados de sentenças em casos de tal quebra (50 penas de prisão em dez anos) revelam ineficácia estatal, ou um baixo índice de real delinquência?
O grande problema é o da ausência de dados fiáveis. Passa-se um pouco como com o tráfico de drogas: mais apreensões significam mais agilidade policial, ou apenas...mais tráfico?
O estudo da corrupção preenche milhões de páginas de milhares de manuais, relatórios e teses, se falarmos só do século XX. O cinema está também cheio de ícones deste universo, com Padrinhos e afilhados, e o mundo clássico das letras trouxe-nos descrições de grande subtileza, sobre os alçapões da natureza humana, ou o mero uso de lugares públicos para ganho próprio, mais ou menos denunciado, mais ou menos combatido.
Nos índices anuais (CPI) de organizações como a Transparency International(TI) as áreas geográficas hiper-corruptas são a África, a América Latina e a Ásia, embora todas elas tenham "ilhas" de seriedade. Mas estas escalas baseiam-se mais em "percepções" do que em elementos objectivos sólidos.
O trabalho não foi, no entanto, uma mera forma superior de poesia. Desde o início que Johann Graff Lambsdorff organizou um grupo de estudo na TI, visando colectar dados de instituições académicas, organizações económicas e instituições de vigilância de todo o mundo. O papel das meras sondagens de opinião ao público, como instrumento de construção do índice, diminuiu nos últimos anos. É hoje preciso que existam pelo menos três entidades fornecedoras de elementos, para que um país surge na lista.
Nos últimos CPI, Portugal aparecia tradicionalmente entre os primeiros 35 estados (numa escala crescente de corrupção), com os mesmos níveis de Espanha e Israel, numa lista total de 173 países, em que, infelizmente, Angola (com o Iraque, o Afeganistão e a Somália) se situa sempre nos casos mais graves.
Claro que o que é "corrupção" para uns, é "prática normal" para outros. Mas, falando só do caso doméstico, e independentemente das palavras, sabemos, no fundo, o que pode corroer uma comunidade.
E sabemos que o bacilo da ruptura está cá dentro.
Falta quantificá-lo.
E (des)qualificá-lo.
Porque não se combate o que não se compreende.