De acordo com os dados do Barómetro de Saúde Oral da Ordem dos Médicos Dentistas, os portugueses, em 2021, diminuíram em 17% a ida ao médico-dentista, face a 2019.
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Se pensarmos que um em cada três portugueses nunca visitam o médico-dentista ou apenas o fazem em situações de urgência, nomeadamente por limitações financeiras, tal determina a ausência de uma resposta fundamental em saúde pública e que se agravou com a pandemia. Mais uma vez, são os pobres os mais afetados.
O Programa Nacional de Promoção de Saúde Oral tem proporcionado a prevenção da doença oral e através do cheque-dentista garantiram-se tratamentos às populações mais vulneráveis. No entanto, a generalidade dos cidadãos com dificuldades económicas continua sem acesso.
O Estado tem a responsabilidade de implementar políticas que promovam a coesão e reduzam as desigualdades. A saúde oral não é um luxo, mas uma necessidade básica.
Nesse sentido, em 2016, o Ministério da Saúde, com o apoio da Ordem dos Médicos Dentistas, decidiu capacitar o SNS para responder às necessidades mais prementes, de forma universal, com equidade e valorizando a proximidade. Desenhou-se uma estratégia no sentido de integrar nos centros de saúde consultórios de médicos-dentistas. O plano, que estava a ser cumprido de forma incremental, previa até 2020 alargar esta resposta a todos os concelhos.
A ambição de que em todos os municípios existisse médico-dentista era exequível, em função do apoio inexcedível das autarquias, unidas num objetivo claro: pela primeira vez, integrar a saúde oral no SNS, 38 anos após a sua criação, democratizando o acesso e atingindo um desígnio nacional.
Para este projeto ser sustentável, o fator mais importante sempre foram os recursos humanos. Os excelentes médicos-dentistas formados em Portugal iriam ter acesso a uma carreira e a um desenvolvimento profissional que visavam defender a qualidade. Nesse sentido, foi elaborada uma proposta fundamentada e equilibrada.
Infelizmente, quatro anos depois, o número de gabinetes de saúde oral é menos de metade do projetado (existirão 140, quando estavam previstos 289 para 2020) e 80% dos dentistas do SNS trabalham a recibos verdes. A carreira não foi criada, nem o modelo implementado.
Numa altura em que aparentemente a palavra de ordem é terminar com os médicos tarefeiros no SNS, a medicina dentária foi esquecida. A paixão pelo projeto "Saúde Oral para Todos" desapareceu. Sobra a resignação pela exclusão dos mais desfavorecidos.
*Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário de S. João