<p>Domingo - A semana começa em angústia. À noite, a Inês fala de Paris. Anuncia-nos, quase com receio, a perda súbita, na flor da idade, do querido filho de um amigo querido. Filho agarrado aos exemplos de vida, ao trabalho, à ajuda ao próximo. Filho amado e respeitado por todos. Filho que se orgulhava dos pais, e que orgulhava os pais. Filho inquieto e curioso, que parte de repente, sereno, sem causa. Da dor e das lágrimas iniciais, percebemos, afinal, que não morreu. Foi chamado. Como se lê nos Coríntios, "Ó morte, onde está a tua vitória? Ó morte, onde está o teu ferrão?" </p>
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Segunda - Continua a falar-se muito do BPN, mas continuo sem saber nada. Como é que se parte para uma nacionalização, acto grave de intervenção da comunidade na economia, sem mais explicações? Como é que não existe detalhe, na exposição da "clandestinidade"? Se a deterioração se deu num período de vários anos, como é que os múltiplos controlos não geraram avisos para a gravidade do caso?
E as operações não declaradas possuíam que objectivo? Enriquecimento ilícito? Fuga ao Fisco? Favorecimento de terceiros? "Lavagem" ou "reciclagem" de capitais? Financiamento de actividades ilegais? Financiamento ilegal de actividades legais?
Terça - Entrevista com o cardeal Stanislaw Dziwisz, para a SIC. O antigo secretário pessoal de Karol Woytila tem um olhar profundo. O olhar de um homem que já viu os prenúncios do fim, e do princípio. O olhar de alguém que, durante 40 anos, esteve ao lado de um vulto admirável, que mudou a História, sem que a História o pudesse mudar. As suas memórias de João Paulo II revelam-nos um prelado humilde, universal mas profundamente polaco, que tinha apenas um casaco, como os camponeses do seu berço. Foi o mesmo Papa que, já enfermo, se disfarçou para poder deambular pelo Vaticano, o mesmo Papa que escutou a confissão do assassino Ali Agca, e benzeu o magnicida Krohn. O Papa que, na altura da eleição anunciada, todos pensaram ser nigeriano, e que, em italiano fluente (em vez do latim corrente), explicou às massas "vir de muito longe", para servir Deus e o povo.
O mesmo papa que, gravemente ferido, num crucial 13 de Maio, na Praça de S. Pedro, terá lembrado Stanislaw Szczepanowski, o padroeiro da Polónia: "Se a palavra não converte, talvez o sangue o faça".
Quarta - Barack Obama foi eleito ontem, sem distúrbios nem "efeito Bradley". Os mesmos americanos que o votaram rejeitaram os casamentos homossexuais, e chumbaram outros referendos "progressistas". Talvez isto mostre que a América rejuvenesceu num dia, mas não mudou. Limitou-se a, friamente, apaixonadamente, idealisticamente, realisticamente, escolher o homem certo, no momento certo. Obama é o ovo de Colombo: com ele, pode recomeçar-se, sem complexos nem bodes expiatórios.
Quinta - O eleito mestiço de Washington, acusado de islamismo e terrorismo, foi anunciado depois de uma prédica religiosa, e do juramento à bandeira, na noite quente do Parque Grant. Hoje, escolhe o seu chefe de gabinete: Rehm Emmanuel, o Karl Rove dos democratas, frio operador político, impiedoso estratego. Judeu, serviu como voluntário em Israel, e apoiou Bush na segunda guerra do Golfo. Tinha trabalhado para Bill Clinton, mas quando a sua mulher lhe pediu apoio, em 2006, respondeu que "estava debaixo da mesa". E não podia.
O seu coração e a sua inteligência já pairavam algures.