Corpo do artigo
A silly season morreu, assim como a paz na cidade de agosto. Nem o verão é um vazio noticioso, nem há ruas vazias e silenciosas no Porto ou em Lisboa, durante o mês das férias. A informação segue o fluxo incessante na televisão e nas redes sociais, assim como o trânsito na VCI ou na Segunda Circular. O silêncio, a calmaria, a inatividade, a pausa, o descanso, a ausência de novidade são coisas que ficaram num outro tempo e cuja memória ou o hábito já não iludem ninguém. Só mesmo os políticos parecem exasperados quando são obrigados a deixar os calções de banho e voltar à gravata para fingir que estão em cima do acontecimento. De resto, toda a gente sabe que este mundo não tira férias. A silly season morreu e o mesmo Governo, exasperado por não ter descanso, contribuiu ativamente para isso. A trinta e um de julho matam a FCT sem avisar ninguém, em pleno processo de avaliação de candidaturas a financiamentos. No início de agosto, quando se assinala a Semana Mundial pelo Aleitamento Materno, a ministra do Trabalho e a bruxa má do Oeste da Segurança Social "sambaram na cara" das mães que escolhem amamentar os seus filhos segundo as recomendações da OMS. Foi um fartote de desinformação, preconceitos e contradição às evidências científicas. Em plena onda de calor e com o país em chamas, fizeram festa no Pontal, deixando o país entregue ao desgoverno da Proteção Civil, demonstrando pouca vontade de dar satisfações aos jornalistas, com a ministra da Administração Interna a "ir embora" sem dar cavaco na conferência de imprensa. Para remediar, Montenegro vem anunciar um superpacote-de-medidas que incluía isenção de taxas moderadoras extintas há anos. E como cereja no topo do bolo, ainda conseguiram matar o Plano Nacional de Leitura, sem explicar como funcionará a Rede de Bibliotecas Escolares, cuja existência também periga. A silly season morreu neste clima de terra queimada, para terminar com tragédia no Elevador da Glória, num país que vota na direita que promete a magreza do Estado, menos funcionários públicos e impostos baixos, sem explicar como assegurará a qualidade dos serviços públicos, cuja decadência é notória desde os tempos da austeridade. A silly season morreu, porque o neoliberalismo mata, sobretudo a nossa esperança, a nossa confiança nas instituições. E nestas cidades sem descanso, em que não há dias de folga ou momentos de silêncio, sobrecarregadas pelo turismo, pelo trânsito e por uma governança que aposta no marketing dos grandes acontecimentos, mas desinveste nos serviços e transportes públicos, isso é cada vez mais gritante. A silly season morreu, assim como a nossa paciência e, com autárquicas à porta, vemos exasperados a falta de candidaturas alternativas, impulsionadas por verdadeiros movimentos de cidadãos, enquanto permanecemos desorganizados e passivos, à espera do próximo verão, bocejando paquidermicamente na fila de trânsito.