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Poucas regiões têm sido tão incensadas, por todos os governos sem excepção, como o Norte. A base exportadora, a capacidade empreendedora, a iniciativa privada, a juventude, o labor, a arquitectura, os músicos e, até, o futebol têm sido pretextos para essa louvação. Frequentemente, não passa de hipocrisia de conveniência que se esquece ou, talvez, repete na próxima paragem. Em época de dificuldades económicas, em que o consenso aponta para o mercado externo como a única alternativa de crescimento, é natural que aquela ladainha se intensifique, como de facto tem acontecido. Afinal, contra ventos e marés, o Norte lá se foi aguentando como a maior região exportadora, mostrando uma resiliência que contrariou, objectiva e, quiçá, subjectivamente, muitos dos profetas da desgraça.
Sucede que os elogios em pouco se têm traduzido. Não que me pareça que a Região deva ter tratamento de favor. Não é isso que está em causa. Como disse Rui Rio, episódios como o protelamento havido na nomeação da presidência da CCDRN, o arrastamento até ao limite da resolução do problema do financiamento da SRU, o adiamento da indicação dos representantes do Estado na Casa da Música e, sobretudo, a não nomeação de novos órgãos de gestão para a Metro do Porto, STCP e APDL não são propriamente consentâneos com a apregoada admiração pela dinâmica da Região e, muito menos, com o empenho na sua revitalização. Na CCDRN a controvérsia não foi maior pelo sentido de dever de Carlos Duarte. Na SRU, Rui Moreira aguentou até ao limite tendo, finalmente, em conjunto com Rio, levado a água ao seu moinho, num dossiê em que não se percebe o masoquismo do governo central num dos poucos temas, a reabilitação urbana, cujas virtualidades são unanimemente reconhecidas. Na Casa da Música, Valente de Oliveira é opção certeira para presidente do Conselho de Curadores, esperando-se que seja capaz de desbloquear a nomeação dos representantes do Estado e, se possível, convencer Nuno Azevedo a dar continuidade ao seu excelente trabalho. Como se tudo isto não chegasse, o que se passa no domínio dos transportes e portos raia o inconcebível e a falta de consideração. Sobre a APDL, já Rui Moreira aqui, no JN, disse o essencial. Nas empresas de transportes públicos, ao mesmo tempo que enche a boca com a urgência de resolver o respectivo problema económico e financeiro, o Governo não parece capaz de encontrar uma solução ou, se a tem, mantém-na no segredo dos deuses centralistas, numa manifesta desconsideração da Junta Metropolitana do Porto, dos seus autarcas e, sobretudo, da sua população.
Adiam-se investimentos e reestruturações, produzindo resultados contrários aos pretendidos. Talvez a morosidade resulte da ingovernabilidade de um ministério megalómano em que Passos Coelho persiste em queimar, para mal de todos nós, um ministro porventura competente para tarefas mais humanas. Pode ser, ainda, que não tenha encontrado o pessoal político com um perfil de competências mínimo para passar o crivo da decência ou, então, que não haja ninguém, com um currículo adequado, disponível para aceitar um cargo daquela responsabilidade pelo nível remuneratório em que, por demagogia, este Governo insiste. O que se poupa num lado (remunerações), mais do que se perde no outro (eficiência).
As empresas de transportes, no seu conjunto, representam mais de 10% da dívida pública. A maior quota de responsabilidade pelos prejuízos acumulados cabe à ambiguidade das políticas seguidas pelos sucessivos governos. Garantir o recrutamento de gestores qualificados, suficientemente independentes para dizerem o que pensam, é, até por isso, essencial. Ao contrário do que alguns no Governo têm feito crer, tal não passa pela concorrência no mercado do produto ou serviço, mas por ser capaz de ir buscar os melhores ao mercado de trabalho. Em inglês, diz-se you pay peanuts, you get monkeys (paga amendoins, arranja macacos). Parafraseando: you pay peanuts, you get boys ou yes men. Será preciso traduzir?