Se já todos percebemos que, no campeonato dos grandes, as europeias são a primeira volta das legislativas, não teria sido mal pensado repetir a experiência de 1987 e fazê-las no mesmo dia.
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Mais que não fosse, a abstenção nas europeias não seria a miséria que se adivinha. Ninguém quer discutir Europa (nem jornalistas, nem políticos) e poucos quererão votar Europa. Para quê? É uma coisa em que, estando dentro, estamos muito distantes. Não contamos para grande coisa nos centros de decisão.
Desta campanha, a maioria dos eleitores o que vai recordar é o salário superior a 20 mil euros que ganha cada deputado. Descontando a demagogia com que se fala sobre este assunto, porque nem tudo é salário. A remuneração base é de quase nove mil euros e o resto são subsídios (para material de trabalho, alojamento e deslocações). O salário base é alto para os padrões portugueses porque se pretende uma uniformidade nos salários que se pagam aos 751 deputados dos 28 países.
Visto a partir dos salários dos eurodeputados, faz todo o sentido a proposta de Marinho e Pinto que pretende ver criados na União Europeia um salário mínimo, uma pensão mínima e um subsídio de desemprego mínimo. De inteira justiça? Quando se pede o impossível, não significa que se perdeu a razão, significa apenas que se convocou a utopia para o debate político. Ainda assim, visto com a simplicidade desta comparação que alguns poderão ser tentados a ver como populista, faz ou não sentido debater esta proposta que Marinho Pinto tentou colocar no debate nacional? A utopia de uma Europa justa é muito mais debate sobre a Europa do que as conversas sobre a primeira volta das legislativas.
Ele nem sequer pede que se permita ao salário mínimo a harmonia que se concedeu ao salário dos eurodeputados. Pede "apenas" que se suba bastante o patamar da dignidade em países como a Bulgária, onde o salário mínimo é inferior a 300 euros. Se há economias nesta União que não suportam esta exigência financeira, então que Bruxelas descubra de onde vai retirar dinheiro para financiar esta imprescindível política de coesão. Marinho e Pinto deseja-nos o melhor dos mundos para ser concretizado em lugar impossível.
Seja, mas se não lutarmos por isso não podemos estranhar que a extrema-direita cresça no Leste da Europa. Se não se deixa viver com dignidade quem trabalha... Sem utopia não se faz caminho. A maior tragédia de uma sociedade acontece quando os seus líderes deixam de sonhar com o melhor para o seu povo.
*Jornalista