O Governo anunciou que vai, dentro de dias, iniciar a cobrança de portagens nas auto-estradas que rodeiam o Grande Porto. Julgo que é uma matéria importante, sobre a qual todos os que têm responsabilidades políticas na região devem ter opinião pública clara.
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Para o fazer é necessário ir ao início da história. Estas auto-estradas, e muitas outras entretanto construídas em todo o país, têm pai. O pai foi o Governo socialista liderado por António Guterres.
À época, foi anunciada uma habilidosa fórmula de engenharia financeira, que, torneando o princípio do investimento directo e imediato do Estado, bem como o do utilizador-pagador, introduzia o termo SCUT no nosso léxico.
Na prática, as grandes construtoras, alavancadas numa Banca em fase de abundância, construíam e "pagavam". Eram ressarcidas em algumas dezenas de anos, com lucros generosos, sem assumirem qualquer risco, através de portagens pagas, não directamente pelos cidadãos utilizadores, mas pelo Estado, na devida proporção do número de veículos que as utilizassem.
À época, muitos dos partidos da Oposição, nomeadamente o PSD, alertaram para a insustentabilidade deste mau negócio. Alertaram também para a mentira da gratuitidade. A gratuitidade teórica para o utente traduz-se no pagamento de cerca de 750 milhões de euros/ano de encargos pagos pelo Governo. Obviamente reflectidos em mais impostos pagos pelos cidadãos. É bom que todos percebamos que não há nada grátis. Ou pagam alguns, os que usam, ou pagam todos através das suas contribuições ao Estado. Ou pior, ninguém paga, e caminha-se para o descalabro orçamental onde nos estamos a afundar.
Sendo defensor, sem demagogia nem falsas promessas incumpríveis, de um programa justo de utilizador-pagador, acho, no entanto, que o Governo escolheu o pior momento e a forma menos apropriada para desenvolver este processo.
Há cinco anos, o país e o Mundo estavam em crescimento, portanto as empresa e os cidadãos estavam mais sensibilizados para a aceitação desta medida. Hoje, estamos no auge de uma crise sem precedentes, com desemprego, falências, desespero. Má altura para introduzir mais um "imposto", ainda por cima politicamente mal "embrulhado".
Porquê só no Norte? Porquê na região mais deprimida económica e socialmente no país'? Esta inexplicável opção geográfica só serve para acicatar o bairrismo ferido de uma população que se sente, desde há décadas, injustamente discriminada.
Porquê com taxas que, aparentemente, são mais elevadas a norte do que a sul? Porquê, sem regimes de excepção para as populações que fazem circuitos curtos, bem como para as actividades económicas de proximidade?
Estou certo de que a maioria dos portugueses está aberta a sacrifícios, mas com equidade. É preciso pagar? Então paguemos todos, do Minho ao Algarve, passando por Ponta Delgada e pelo Funchal. Então paguemos todos pelos mesmos níveis sem discriminações regionais e, se possível, encontrem-se as soluções técnicas que não massacrem as populações e as empresas nos trajectos curtos do seu dia-a-dia.
Agora querem que paguemos só alguns e a dobrar? Um dos que estão a pagar, imerecidamente, é o actual ministro - de quem tenho a melhor das impressões pessoais, profissionais e políticas. Não é justo que seja ele a assumir, quase sozinho, a factura política. As manifestações e os protestos deviam ser à porta de Mário Lino e, já agora, também umas buzinadelas à porta de João Cravinho.
Do actual ministro, homem que reputo de sério e sensato, esperamos o golpe de asa que salve a face do Governo e reponha o equilíbrio numa decisão precipitada. Sejamos justos, António Mendonça só é culpado de gerir esta "herança", procuremos ter uma atitude de diálogo, que lhe dê espaço para negociar uma solução final equilibrada.
Todavia, e cinco anos de demagogia insustentável, ficaram por pagar quase quatro biliões de euros, ou seja, o custo do aeroporto de Alcochete!
Ou da Ota, ministro Mário Lino!