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Não erramos se dissermos que um ano depois o Mundo continua a girar fora dos eixos. Todos os meses o terrorismo faz centenas de vítimas, algumas em lugares tão distantes de nós que não vão além de uma breve nos jornais. Em Mossul, os combatentes do Daesh executam civis e estão a acumular reservas de amónia e enxofre, fazendo aumentar os receios de ataques químicos.
Um ano depois o turismo ainda se ressente do medo, em Paris. A cooperação e o aprofundamento da capacidade policial não produziram mais do que medidas incipientes. Bélgica e Alemanha sofreram ondas de choque difíceis de interpretar. A Europa passou longos meses a discutir sanções e metas económicas, mais do que a investir na sua coesão e renovação. E estamos ainda longe de perspetivar o efeito que irá ter o Brexit ou mesmo os passos que faltam para concretizar a decisão saída do referendo.
Nos Estados Unidos da América digere-se a vitória de Donald Trump e os sinais de xenofobia. O presidente eleito não perdeu tempo a contactar a extrema-direita europeia, reunindo-se com Nigel Farage e falando com Marine Le Pen. Mas dos Estados Unidos vêm também análises desconcertantes e eleitores que se explicam de forma surpreendente. Sim, há imigrantes islâmicos que votaram em Trump e que se assumem revoltados com a visão de Obama relativamente aos fenómenos de radicalização.
Um ano depois, não estamos mais tolerantes, nem mais inclusivos, nem sequer mais munidos de condições (policiais e sociais) para lidar com o terrorismo. O drama dos refugiados está por resolver e uma grande parte dos europeus que destilam ódio nas redes sociais não sabe distinguir islamismo de extremismo.
Há feridas que nunca saram e famílias que nunca mais serão as mesmas. Mas depois de um longo silêncio, os acordes voltaram a ouvir-se no Bataclan. As portas reabriram-se e as memórias vivas da sala manchada de sangue foram confortadas pela música. E essa é a melhor forma de homenagear os mortos: celebrar a vida.
Podemos recear que outro 13 de novembro nos surpreenda. Podemos olhar de lado os nacionalismos a crescer na Europa. Podemos refletir sobre os muros que se erguem em tantas partes do Mundo. Mas as interrogações são um sinal de que reconhecemos a urgência de não baixarmos os braços. Vale mais a pena acreditar que tanta inquietação abre espaço à esperança.
A vida encontra sempre o caminho entre as cinzas.
SUBDIRETORA