A relação entre a Igreja e a comunicação social é por vezes crispada, sobretudo quando denuncia escândalos e não dá o devido destaque ao que se faz bem. Mais relevo merece, por isso, o facto de o Papa Francisco ter elogiado os jornalistas precisamente por denunciarem os casos de abuso sexual no interior da Igreja - tendo condenado os que criticam os média por fazê-lo.
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Todos os anos, nas vésperas do Natal, o Papa dirige um discurso à Cúria Romana. Habitualmente não se fica pela mera apresentação das felicitações natalícias. Aproveita para denunciar comportamentos desajustados na Igreja Católica, envolvendo alguns altos responsáveis pelo seu governo.
Este ano, na passada sexta-feira, criticou "o contratestemunho e os escândalos de alguns filhos e ministros da Igreja", que põem em causa e ofuscam "o exemplo heroico dos mártires e de inúmeros bons samaritanos" e de tantos "consagrados e consagradas, bispos e sacerdotes, que vivem diariamente a sua vocação com fidelidade".
Para além de condenar os que abusam dos menores, o Papa garantiu "que a Igreja, perante estes abomínios, não poupará esforços, fazendo tudo o que for necessário para entregar à Justiça toda a pessoa que tenha cometido tais delitos". E apelou com veemência aos criminosos: "Convertei-vos, entregai-vos à justiça humana e preparai-vos para a justiça divina".
Foi neste contexto que o Papa disse que "ao falar deste flagelo, alguns - dentro da Igreja - arremetem contra certos operadores da comunicação, acusando-os de ignorar que a maioria absoluta dos casos de abusos não é cometida pelos clérigos da Igreja - as estatísticas apontam para mais de 95% - e acusando-os de querer intencionalmente dar uma imagem falsa, como se este mal tivesse atingido apenas a Igreja Católica".
Em vez de seguir esse caminho, o Papa preferiu agradecer "aos operadores dos "mass media" que foram honestos e objetivos e que procuraram desmascarar estes lobos e dar voz às vítimas. Mesmo que se tratasse de um único caso de abuso - que de "per si" já constitui uma monstruosidade -, a Igreja pede que não seja silenciado, mas que o tragam objetivamente à luz, porque o maior escândalo nesta matéria é o de encobrir a verdade".
Não é a primeira vez que o Papa manifesta a sua gratidão aos jornalistas. No início de novembro, quando recebeu estudantes e professores de uma escola de jornalismo alemã, agradeceu-lhes "por falarem sobre as coisas bonitas que podem não ser manchetes, mas que colocam as pessoas no centro".
No discurso à Cúria, numa crítica velada aos que não o fazem, o Papa referiu "os numerosos párocos que dia a dia dão bom exemplo ao povo de Deus, sacerdotes próximos das famílias, que conhecem o nome de todos e vivem a sua vida com simplicidade, fé, zelo, santidade e caridade. Pessoas esquecidas pelos "mass media", mas sem as quais reinaria a escuridão".
Tal como o Papa, todos deveriam ter um maior respeito pelo trabalho dos jornalistas, quando ele é bem feito, sem deixar de os criticar quando não o fazem.
Um Feliz Natal!
* Padre