Parece que não. O Programa de Ajustamento finado com pompa e circunstância por Governo e Oposição, estatelou-se de novo nas nossas caras, em efeito boomerang, pelas mãos do Tribunal Constitucional. Confesso a minha dupla estupefação. A de ter assistido a um enterro cujo morto não estava afinal bem morto e a de ter verificado que há instituições no meu país cujo timing não se altera, nem em caso de morte anunciada.
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Ou seja, como é possível que o Tribunal Constitucional (TC) sabendo das implicações das suas decisões no processo de ajustamento em curso, mais precisamente no que diz respeito ao respetivo processo de encerramento, se dê ao luxo de esperar pelo fim formal do programa para anunciar decisões que sabia de antemão serem profundamente adversas ao mesmo encerramento? Que espécie de irresponsabilidade é esta que permite enxovalhar a palavra de um país?
Independentemente das controvérsias, das argumentações e contra-argumentações, do ganhar tempo que se ensaia, dos esclarecimentos que não virão, da teimosia na manutenção de certas medidas ou da falta de capacidade para descortinar outras, a verdade é que o Tribunal Constitucional merece, do meu ponto de vista, crítica acérrima, pelo simples facto de se dar ao direito de gerir o seu tempo acima dos interesses do país.
E pelos vistos o filme continua. A decisão sobre a constitucionalidade da Contribuição Especial de Solidariedade (CES) só se conhecerá quando o tribunal entender, ou seja, quando calhar.
Arrogando-se a impassibilidade de quem domina o tempo, o TC alimenta reações em tiro para todos os lados, Parlamento, presidente da República, subscritores dos pedidos de fiscalização, que por sua vez se amplificam numa Comunicação Social que à força de fazer coincidir analistas com políticos (partidários) pouco explica e nada esclarece.
Fazer os portugueses e estrangeiros respirar de algum alívio para a seguir lhes baterem com a porta na cara é má ideia. Acentua os extremismos (ainda há tão pouco tempo sinalizados nas eleições europeias) dos autóctones e faz perder a paciência e a alocação de recursos das instituições e dos mercados internacionais, respetivamente.
E no entanto, já não é a primeira vez. Mas nem assim, tal como sempre defendi, o Sr. Presidente da República, oportunamente se decidiu pela fiscalização preventiva do orçamento. Diga lá, Sr. Presidente, se é pior viver uns meses com duodécimos ou fazer esta linda figura?
E aposto como não vai querer envolver-se na sua resolução. Argumentos não lhe faltarão.
Espero que pelo menos se faça o que o Governo quer e se arranje forma de perceber, realmente, qual é a dimensão do problema. O Governo tem razão quando diz que tem forçosamente de a conhecer. O Documento de Estratégia Orçamental já foi aprovado e assumido no encerramento dos nossos negócios com a troika e o Pacto Orçamental já aí está a reclamar obediência, tutelado pela Comissão Europeia.
Não tenho esperança que o TC dê o braço a torcer. Pelo que percebi, uma vez que os impostos calham a todos, então essa é a via para defender o princípio supremo da igualdade. Mesmo que, para sermos todos iguais, tenhamos de condenar à pobreza os que diferenciadamente iriam contribuir para a nossa sobrevivência coletiva. Sempre é melhor que morramos todos do que alguns tenham de contribuir um pouco mais do que outros.
E mesmo que todos já sintamos náusea ou asfixia quando ouvimos a ameaça da subida de impostos!
É pena que a clarificação de chefias no PS venha relativizando o debate sobre este tema. Por mais picante que seja, no ver dos media, não devia ultrapassar em termos de debate público a avaliação de uma instituição que por se sentir livre de constrangimentos ideológicos e hierárquicos age fora do tempo, sem perceber o dano que essa espécie de Olimpo temporal nos provoca.
Mas também espero que quem nos governa exorcize tentações de crise política que embora compreensivelmente apetecíveis do ponto de vista partidário, trariam gravíssimas consequências ao país.
Faço a justiça de achar que o primeiro-ministro não o fará, ainda que tenha de congelar o seu vice para que este não carregue no botão vermelho!