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Já aqui me referi várias vezes, em artigos anteriores, à posiçãosubmissa e demasiado cordata do Governo face às entidades com quem tem vindo a negociar a resolução dos nossos problemas financeiros. Revendo o que aqui escrevi, raras são as crónicas em que não faço referência à incapacidade do Governo para se fazer ouvir na Europa e à sua evidente falta de força política para negociar.
Para Pedro Passos Coelho e Vitor Gaspar, o memorando assinado com a troika é sagrado e não há nada a fazer. Da dívida pública, nem falar. Ainda que inúmeras e reputadas personalidades portuguesas ( e já não só portuguesas ) de reconhecida competência tenham dito e repetido que o nosso país não tem condições sequer para cumprir com o serviço da dívida, a manterem-se as condições atuais, a resposta foi sempre a mesma - não há capacidade de manobra.
Sempre me questionei se esta persistência no "não há nada a fazer" não seria antes a demonstração pública da incompetência política para assumir grandes combates e do isolamento europeu em que permanece este Governo.
Contudo, esta semana, tudo se tornou mais claro. Aquilo que antes eram dúvidas são hoje certezas. Afinal conseguir novas condições para a dívida portuguesa é possível. A Grécia conseguiu em Bruxelas uma redução dos juros e um considerável alargamento dos prazos de pagamento. Desde logo, uma moratória de 15 anos para o pagamento de juros ao Fundo Europeu de Estabilidade Financeira, mas também a renúncia do Banco Central Europeu a parte dos ganhos conseguidos à conta da dívida grega, para além de uma redução parcial de juros.
É, por isso, espantoso que o ministro das Finanças tenha referido no debate do Orçamento de Estado, com uma candura tocante, que "Portugal e Irlanda... de acordo com o princípio de igualdade de tratamento... serão beneficiados pelas condições abertas no quadro do Mecanismo Europeu de Estabilidade Financeira". Ou seja, interpretando a frase - uma vez que somos incapazes de deixar de fazer o papel de bons rapazes, de negociar como iguais e com frontalidade, vamos à boleia da Grécia.
Tudo bem, teremos que ter condições semelhantes. Mas o que é confrangedor é constatar a menoridade política do primeiro ministro e do ministro das Finanças perante os hoje " fortes " da União Europeia . A um ministro das Finanças não se exige que seja um político hábil e experimentado, moldado pelos duros combates e exigências que devem caracterizar a vida pública. Já para se ser primeiro-ministro de uma democracia consolidada, estas são condições básicas. Ora o primeiro-ministro nunca descolou das posições de Vítor Gaspar. Pelo contrário. Tem feito gala em dizer que esta é a sua política e a de todo o Governo.
Mas se a experiência política não me parece ser um atributo essencial a um ministro das Finanças, uma outra condição é exigível aos dois, face às grandes responsabilidades de que estão investidos - é saberem história. Pelo menos na parte que respeita à sua atividade e faz parte da cultura geral. Se fossem minimamente informados, saberiam que os países hoje "fortes" também já foram fracos. Já precisaram da ajuda internacional para chegarem onde estão. A Alemanha, a Inglaterra, o Canadá, a Suécia, para citar apenas alguns, já viram as suas dívidas reestruturadas quando também eles viveram tempos de enormes dificuldades ou estiveram perante grandes desafios. E, nalguns casos, elas foram mesmo parcialmente perdoadas.
Por tudo isto, dói ver o que se está a passar no nosso país. Em finais de 2011, a divida pública portuguesa representava (segundo o Eurostat) cerca de 108% do produto interno bruto. Agora, vamos nos 117,6 %. No final do ano estima-se que cheguemos aos 200 mil milhões representando 119% do PIB. E tantos sacrifícios a serem impostos aos portugueses!
Começa já a pôr-se em dúvida que o caso da Grécia se aplique também a Portugal. Claro,neste domínio, ninguém espere favores. As negociações serão sempre duras, difíceis e longas. Não se dá nada a ninguém - conquista-se. Quando é que o Governo percebe isto?
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