São dois casos de absoluta prepotência. Dois casos que, embora diferentes, revelam trejeitos de autoritarismo e de superioridade moral e legal. Um passou-se em Portugal. Outro no Canadá. Países onde se espera mais respeito pelas instituições democráticas e que o princípio da separação de poderes não seja um mero exercício teórico.
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O episódio português prende-se com uma pergunta. Numa flash interview, uma jornalista questionou o treinador do Sporting sobre as críticas que Slimani lhe dirigiu. ("Que comentários lhe merecem o que Slimani disse que, ao que tudo indica, Ruben Amorim não queria que Slimani jogasse porque preferia que Paulinho estivesse no onze inicial?"). O treinador dos leões foi elegante. Não respondeu e remeteu a questão para a conferência de imprensa. Mas, o Conselho de Disciplina da FPF entende que um jornalista não é um jornalista. É, sim, "um agente desportivo" e, como tal, violou o Regulamento Disciplinar da Federação por fazer uma "pergunta não relacionada com o jogo". Em conclusão, a jornalista pode ser multada por estar a desempenhar a sua função. Simplesmente ridículo.
A outra peripécia desenrola-se no Canadá. Várias rádios deixaram de transmitir músicas dos Arcade Fire, após o vocalista ter sido acusado de assediar quatro pessoas, entre 2016 e 2020. Win Butler defendeu-se das acusações e afirmou que "todas as relações que teve foram consensuais". Admite um comportamento impróprio, relacionado com alcoolismo e depressão. A investigação decorre. Mas as rádios canadianas já fizeram a sua justiça, ditaram a sentença. Fizeram-no afetando todo o grupo e não apenas o indivíduo em causa.
É a lamentável justiça das redes sociais a instalar-se em instituições e em empresas. É que o fundamentalismo e o extremismo não estão apenas nos líderes e nos partidos que conhecemos. A Justiça lenta não explica tudo. E a separação de poderes tem de ser, cada vez mais, intocável. Basta um funcionar mal e cai tudo por terra.
*Diretor-adjunto