Segundo os "mentideros", o chefe do novo comando africano dos EUA (AFRICOM), general Ward, terá perguntado a um político português por que é que vários responsáveis do continente não gostam da presença americana.
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Depende: em Angola, onde Ward esteve em Dezembro (com o general Sanjar), a ajuda de Washington é bem- vinda, se for exposta directamente, e não por intermediários. Na Tunísia e no Magrebe, em geral, os americanos aparecem como poderosos aliados na luta contra a "subversão" interna. No Sahel, idem. E se o AFRICOM continuar a política de cooperação não-militar, feita por militares (incluindo a guerra à guerra), talvez o gelo, herdado ainda da Guerra-Fria, acabe por se partir. O papel das ex-potências administrantes europeias é paradoxal. Por um lado, nenhum governo africano que se preze deixará que a defesa do país seja feita nas antigas "metrópoles". Por outro lado, os novos estados africanos sabem que toda a segurança eficaz nasce da colaboração internacional. Por um lado, os europeus que descolonizaram mal, sentindo dores de consciência, querem continuar a acompanhar a África, como a um filho desprotegido, durante um divórcio litigioso. Por outro, as opiniões públicas da Europa resmungam contra os recursos usados na ajuda a África, se não vierem daí resultados imediatos e visíveis, e tendo em conta as novas penúrias da União. Por um lado, as elites africanas precisam da Europa: é aí que estudam os seus filhos, é aí que estão as suas propriedades, é aí que mantêm as suas contas bancárias. Por outro, muitas empresas europeias precisam dos políticos africanos: estes são financiadores, parceiros, investidores, sócios. Por um lado, os governos africanos fogem do "neocolonialismo" como o diabo da cruz. Por outro, sabem que, ao longo da história, ficou algo de África na Europa, e algo da Europa na África. Isso sente-se mais em certos sítios do que noutros, sobretudo se numas aventuras africanas houve miscigenação e construção social, e noutras apenas apartamento e selecção racial. Por um lado, os novos governos africanos precisam de, num esforço de recriação da memória histórica e cultural, reabilitar dialectos e tradições locais, mesmo que isso signifique reinstituir um mosaico de soluções. Por outro, sabem que as línguas de origem europeia funcionam como elemento unificador de sociedades complexas, ou artificiais, ou sob risco de secessão. E reconhecem a força de afirmação global, num mundo sem fronteiras absolutas, das mesmas línguas. Destas aparentes contradições, que reflectem a realidade, far-se-á um caminho. Será só euro-africano, ou euro-americano-africano? Eis a questão. Os EUA, por exemplo, através de programas como o ACRI, o ACOTA ou o GPOI, têm tentado, desde Bill Clinton, concertar uma política africana de missões militares de manutenção de paz. Mas continuam a ser olhados, nalguns meios continentais, como um poder imperial que quer, debaixo da mesa, assegurar o controlo do fluxo de matérias-primas, e a protecção das linhas de comunicação aeromarítimas. Por outro lado, os sistemas europeus de apoio militar à paz (RECAMP francês, "Felino" na CPLP, as estruturas BMATT britânicas) não se entroncam, a não ser episodicamente, no pensamento e nas acções do AFRICOM. Mas não tem de ser assim para sempre. A regra de ouro é, para já, a de falar claro, com todos os envolvidos. Admitir um projecto de poder, explicar os receios de segurança, estender uma mão, não precisam de ser dados antagónicos. E depois se verá. S egundo os "mentideros", o chefe do novo comando africano dos EUA (AFRICOM), general Ward, terá perguntado a um político português por que é que vários responsáveis do continente não gostam da presença americana. Depende: em Angola, onde Ward esteve em Dezembro (com o general Sanjar), a ajuda de Washington é bem- vinda, se for exposta directamente, e não por intermediários. Na Tunísia e no Magrebe, em geral, os americanos aparecem como poderosos aliados na luta contra a "subversão" interna. No Sahel, idem. E se o AFRICOM continuar a política de cooperação não-militar, feita por militares (incluindo a guerra à guerra), talvez o gelo, herdado ainda da Guerra-Fria, acabe por se partir. O papel das ex-potências administrantes europeias é paradoxal. Por um lado, nenhum governo africano que se preze deixará que a defesa do país seja feita nas antigas "metrópoles". Por outro lado, os novos estados africanos sabem que toda a segurança eficaz nasce da colaboração internacional. Por um lado, os europeus que descolonizaram mal, sentindo dores de consciência, querem continuar a acompanhar a África, como a um filho desprotegido, durante um divórcio litigioso. Por outro, as opiniões públicas da Europa resmungam contra os recursos usados na ajuda a África, se não vierem daí resultados imediatos e visíveis, e tendo em conta as novas penúrias da União. Por um lado, as elites africanas precisam da Europa: é aí que estudam os seus filhos, é aí que estão as suas propriedades, é aí que mantêm as suas contas bancárias. Por outro, muitas empresas europeias precisam dos políticos africanos: estes são financiadores, parceiros, investidores, sócios. Por um lado, os governos africanos fogem do "neocolonialismo" como o diabo da cruz. Por outro, sabem que, ao longo da história, ficou algo de África na Europa, e algo da Europa na África. Isso sente-se mais em certos sítios do que noutros, sobretudo se numas aventuras africanas houve miscigenação e construção social, e noutras apenas apartamento e selecção racial. Por um lado, os novos governos africanos precisam de, num esforço de recriação da memória histórica e cultural, reabilitar dialectos e tradições locais, mesmo que isso signifique reinstituir um mosaico de soluções. Por outro, sabem que as línguas de origem europeia funcionam como elemento unificador de sociedades complexas, ou artificiais, ou sob risco de secessão. E reconhecem a força de afirmação global, num mundo sem fronteiras absolutas, das mesmas línguas. Destas aparentes contradições, que reflectem a realidade, far-se-á um caminho. Será só euro-africano, ou euro-americano-africano? Eis a questão. Os EUA, por exemplo, através de programas como o ACRI, o ACOTA ou o GPOI, têm tentado, desde Bill Clinton, concertar uma política africana de missões militares de manutenção de paz. Mas continuam a ser olhados, nalguns meios continentais, como um poder imperial que quer, debaixo da mesa, assegurar o controlo do fluxo de matérias-primas, e a protecção das linhas de comunicação aeromarítimas. Por outro lado, os sistemas europeus de apoio militar à paz (RECAMP francês, "Felino" na CPLP, as estruturas BMATT britânicas) não se entroncam, a não ser episodicamente, no pensamento e nas acções do AFRICOM. Mas não tem de ser assim para sempre. A regra de ouro é, para já, a de falar claro, com todos os envolvidos. Admitir um projecto de poder, explicar os receios de segurança, estender uma mão, não precisam de ser dados antagónicos. E depois se verá.