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Empanzinados pela dieta gulosa do Natal, e ainda a água das pedras, vêm aqueles organismos das Nações Unidas bater-nos à porta da má consciência coletiva. Lembram uns que, neste Mundo que partilhamos, ainda há quase 800 milhões de pessoas a passar fome. É o equivalente a 80 portugais de famintos. E previnem outros que, não satisfeitos, atiramos ao lixo um terço da produção alimentar mundial.
Valha-nos, no desconsolo, saber que ainda há boas notícias, logo no primeiro dia do ano que aí vem: o salário mínimo nacional sobe para euro530, uma generosidade do Governo, equivalente a 66 cêntimos líquidos, um cafezinho por dia.
Tudo isto, porque me lembrei daquela cena da Madonna, há uns anos, quando organizou uma festa de arromba, na sede das Nações Unidas, para recolher fundos para as criancinhas do Malawi. A quermesse dos famosos, que celebrava também a abertura de uma nova loja de uma conhecida marca de luxo, consistia em comer e beber pelos pretinhos que passam fome. À saída do evento, cada um tinha direito a uma carteira da marca, avaliada em 800 dólares, o equivalente ao rendimento anual per capita daquele mesmo Malawi...
Outra celebridade de Hollywood, Lindsay Lohan, é mais generosa. Acaba de partilhar no Instagram uma foto em que se mostra embrulhada numa túnica de outra marca de luxo, agora para angariar fundos para os mais necessitados. A túnica custa 1200 dólares. Mas como a atriz, modelo e cantora não esclarece a quem darmos a nossa contribuição, tivemos de informar-nos de que países têm um rendimento anual per capita equivalente ao valor daquele pedaço de pano. E lá está: a quermesse deve beneficiar, entre outros, talvez a Guiné ou Moçambique.
Há tempos, também me calhou participar numa dessas iniciativas. Mais coisa menos coisa, era uma ceia de caridade pelos que passam fome no Mundo, assim, em geral. Comi e bebi como nunca. Ao chegar a casa, vomitei e fui dormir, imaginando que o que o autoclismo levara acabaria saindo por alguma aldeia africana. E que ali estaria alguma celebridade junto aos meninos que o iriam comer. Para que todos nós, os que trabalhamos para comer, tomemos consciência de quão afortunados somos por ter no Mundo gente tão rica com um coração tão grande.
Bom ano para todos! Com menos azia.
DIRETOR