Em semana de Carnaval, as expectativas concentram-se na Quarta-feira de Cinzas e no discurso de tomada de posse de Cavaco Silva. Tendo tido tempo de perceber a forma como os mercados e instituições internacionais estão a reagir ao desempenho recente da economia portuguesa, espera-se que o presidente reeleito nos apresente a sua leitura de como as coisas poderão evoluir e que papel vê para si.
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Não obstante uma razoável execução orçamental, a pressão sobre Portugal não abrandou e nem sequer dá sinais de vir a afrouxar. Os nossos parceiros não parecem muito comovidos com a situação, não sendo expectável que das próximas reuniões europeias resultem mudanças que aliviem a pressão. Para além do mais, a solução de que tantas vezes se falou - o recurso à dupla FEEF-FMI - não se afigura uma alternativa: tanto na Grécia como na Irlanda, as taxas de juro não apenas não desceram como aumentaram, com as agências de notação, cinicamente, ajudando "à festa", baixando o rating de ambos os países. A nossa situação, contudo, terá um desfecho muito em breve, não apenas por causa da dívida pública (não se aguenta o nível actual das taxas de juro por muito mais tempo) mas também da privada: se os bancos portugueses não conseguirem desbloquear o acesso aos mercados internacionais, e o Banco Central Europeu deixar de lhes emprestar meios, a sua posição tornar-se-á insustentável, tornando inevitável o recurso à ajuda externa, mesmo em condições gravosas.
Ainda haverá alguma coisa que possamos fazer? Para além das bravatas de analistas que conseguiriam tudo resolver, nenhum governo faria muito diferente do que este está a fazer. Seriam, talvez, mais sérios, menos levianamente optimistas, não camuflariam os problemas. Toda uma diferença em termos de respeito pelos cidadãos mas, no que se refere às medidas económicas, as diferenças não seriam muitas: algum partido, mesmo com maioria absoluta, arriscaria as mudanças drásticas necessárias? Com este quadro de fundo, a última tábua de salvação será a celebração de um pacto político e social, envolvendo o maior número de actores possível, que possa simbolizar, perante o exterior, a determinação de um país a encontrar um rumo. No domínio político, será indispensável o envolvimento de PS e PSD e desejável o do CDS. No plano social, para além de confederações patronais e da UGT (a CGTP não deve ser excluída mas excluir-se-á), é fundamental convocar entidades, como as IPSS e as misericórdias, que têm uma relação próxima com as questões da exclusão, desemprego e fome.
Peremptórios, os cínicos dizem que tal acordo é impossível, dados os protagonistas. Se tiverem uma réstia de respeito pelo povo português, hão-de ser capazes de controlar os egos respectivos. Do presidente da República espera-se que capitaneie o processo. Não numa lógica de homem providencial e de refundação do regime mas numa postura de serviço ao povo português, com a determinação que tal implica, rompendo se tiver de romper, denunciando o que houver a denunciar. Portugal precisa de um Cavaco Silva disponível para este combate: se ele o perder, perdemos todos.
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