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O Ministério Público é a magistratura mal-amada dos tribunais. Competindo-lhe o poder dever, de iniciativa, intervenção e imediação, os interesses criminosos ilegais e abusivos convivem mal com o exercício das funções que a lei constitucional e ordinária atribui ao MP. Este prossegue o interesse colectivo numa actuação subordinada exclusivamente aos princípios da legalidade e objectividade, no rigoroso cumprimento do princípio de igualdade de oportunidades de todos os cidadãos perante a lei. Estas considerações vêm, ainda, a propósito das críticas infundadas e despropositadas que alguns opinadores, costumeiros, dirigiram a esta magistratura a propósito da decisão do respectivo sindicato decretar dias de greve a decorrer no presente mês. Os magistrados do MP defendem a legalidade democrática, zelam pelo cumprimento das leis, desdobram-se no seu dia-a-dia de trabalho, no cumprimento multifacetado, exigente, complexo e premente das funções que a lei lhe confiou. O MP não é quimicamente puro. Na estreita delimitação da subjectividade que subjaz à sua actividade, inerente a toda a ciência não exacta, o magistrado pode incorrer na prática de actos e diligências discutíveis. Mas o MP é uma magistratura hierarquizada, cuja fiscalização e controlo não se pode bastar pela quantidade do trabalho desenvolvido. Haverá, necessariamente, espaço para uma intervenção hierárquica, seja local, regional ou nacional para conjugação e unificação de procedimentos processuais. Nomeadamente, para sintonizar, aliás em conformidade com o que dita a lei, a realização de diligências que contraiam os direitos fundamentais do arguido, como sejam a exigência de pressupostos para a detenção e promoção da prisão preventiva de suspeitos ou arguidos ou para a promoção de escutas telefónicas por períodos de tempo considerados razoáveis para a sua realização. É racional pensar, ou sequer imaginar, que um magistrado omita aos seus superiores hierárquicos a existência de um inquérito passível de grande repercussão social ou política? Não é racional… É imaginável que um magistrado decida, sem comunicação prévia à hierarquia, a execução de buscas e apreensões ou a detenção de suspeitos ou arguidos de elevada projecção social ou política? Não é imaginável. É razoável pensar que cerca de 1200 magistrados do MP se consumam, cada um por si, na penumbra do seu gabinete, a urdir teias de perseguição à classe política ou a personalidades relevantes da vida económica e social do país? Não é razoável… A teoria da conspiração já vai longe demais e quem a propaga deverá preocupar-se com os efeitos destrutivos que provocam à nossa democracia, porque aquela, sim, desestabiliza e ameaça o regular funcionamento das instituições do Estado, fazendo perigar a nossa liberdade.
*A autora escreve segundo a antiga ortografia