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Os chamados megaprocessos são tema recorrente em debates e entrevistas nos meios da Comunicação Social, nomeadamente nos diversos canais de televisão. De uma maneira geral, comentadores e analistas abordam o tema de uma forma negativa, peremptória na sua rejeição, como se, de repente, o MP fosse atacado por uma “loucura” suicidária, criando monstros processuais que acabam, afinal, por contaminar a simplicidade da investigação, complicar o seu próprio trabalho e objectivo, deduzir acusação ou arquivar o processo. Passam, consciente ou inconscientemente, um atestado de incompetência aos magistrados e atribuem-lhes uma intenção de criar um labirinto ingerível, que se arrasta às diferentes fases processuais, até à exaustão.
O MP é uma magistratura responsável, à qual compete, na fase do inquérito, apurar da existência de crime, os seus agentes, respectiva responsabilidade criminal, descobrir e recolher provas com a finalidade de decidir sobre a acusação ou arquivamento dos autos. A realização das diligências pode mostrar-se complexa, morosa e extensa. Depende da natureza do crime, das teias urdidas pelos seus autores para maquilhar de lícita a actuação criminosa, prolongada no tempo, a maioria das vezes. É complexa e avessa à precipitação e celeridade.
Vem sendo difundido, voluntária ou negligentemente, o mito judiciário de que é o MP que, no seu livre-arbítrio, decide construir megaprocessos, desnecessariamente. Porém, a lei é expressa na definição dos casos de conexão e ao determinar que “para todos os crimes determinantes de uma conexão, organiza-se um só processo” e que se já tiverem sido instaurados processos distintos, logo que a conexão seja reconhecida, “procede-se à apensação” de todos àquele que respeitar ao crime determinante da competência. A conexão de processos ocorre, normalmente, nos crimes de natureza económico-financeira. De complexa investigação, demandando perícias contabilísticas e financeiras, a colaboração internacional das autoridades penais de outros países, nos quais os criminosos têm, por prevenção e despiste, os seus bens de origem ilícita.
Por outro lado, a condenação deve ocorrer em um único processo, considerando os fins das penas, a prevenção geral e especial. Só assim se encontrará a medida da pena adequada à responsabilidade penal global do arguido, suas atenuantes e agravantes. Disseminar em penas parcelares as diversas condenações por crimes que se conexionam não permite uma apreciação total e única da personalidade criminosa do arguido, da sua dissidência comportamental desconforme ao direito, a gravidade e a ilicitude dos factos e actos ilícitos praticados.
Os megaprocessos não são resultado de uma birra, mas um mal muitas vezes necessário e inultrapassável. De impedir, sim, as diligências dilatórias, que se multiplicam por toda a tramitação processual.
A autora escreve segundo a antiga ortografia