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Está visto que não vai haver "regionalização" tão cedo! E não apenas porque a sua concretização está dependente dum referendo a que a Constituição obriga mas também porque, para tanto, falta vontade política. Tanto para fazer o referendo como para o retirar da Constituição. Falta vontade política e falta também convicção. Pelo menos, assim parece. Seja porque ninguém consegue adiantar um projecto minimamente coerente e consistente para a reforma de que todos falamos, seja porque os que são avançados, são tudo menos coerentes e consistentes.
O problema é que não se vê alternativa para a reorganização administrativa do país. Chame-se-lhe ou não "regionalização". Claro que esta designação não é indiferente e até pode acontecer que seja útil ou até necessário inventar um novo nome para uma nova ideia e para um novo conceito, e para que se possa falar verdadeiramente de um projecto de mudança e de uma verdadeira reforma modernizadora do país.
Claro que, num contexto de ausência (quase total) de ideias sobre como fazer uma qualquer reforma (seja ela, ou não, a dita regionalização) e decorridos mais de uma dúzia de anos sobre a oportunidade perdida de a começar quando do referendo de 1998 - ainda que partindo duma base pouco sólida - sempre será melhor não dar passos no escuro e contra a vontade de uma parte significativa dos portugueses ou, pelo menos, num quadro de apatia geral perante tão ingente questão.
Claro que "quem não tem cão, caça com gato" e, por isso, quem não tem "região" ocupa-se com a "freguesia". Por isso, e à falta de melhor, começaram a aparecer propostas para a reorganização deste primeiro patamar da Administração Pública, ainda que, sobre a matéria, também não exista teoria alguma. Pelo menos que seja do conhecimento tanto da generalidade dos cidadãos como das associações nacionais de municípios e de freguesias que, valha a verdade, se têm remetido ao mais comprometedor silêncio. Contudo, Lisboa tirou o esqueleto do armário, deu o primeiro passo e, pelo menos, Gaia seguiu-lhe o exemplo. E ainda bem.
Aparentemente, ambos os municípios foram no mesmo sentido, ou seja, no sentido de reduzir o número de freguesias e, consequentemente, no de aumentar o respectivo território e a correspondente população. O que significa que, em qualquer das propostas, há uma clara aposta na mudança quantitativa sem que, no entanto, lhe tenha sido associada uma ideia quanto à mudança qualitativa operada ao nível do que continua a ser o primeiro e o mais básico escalão da Administração Pública. Há, portanto, uma clara mudança de escala mas sem que se tenha, ainda, uma ideia precisa das alterações ao nível das capacidades e das competências deste primeiro escalão do poder local e sem que, por exemplo, a relação com o município e com as restantes instâncias da Administração - incluindo as hipotéticas "regiões" - tenha sido claramente equacionada. E é tempo de o ser.
Contudo, nem tudo será nebuloso mar de dúvidas que atravessamos! E, a prova é que, recentemente, o secretário-geral do PS, talvez tenha dado o sinal de que é em tempo de incertezas que as certezas mais se apreciam, ao propor que, não havendo espaço nem condições, políticas e outras, para a "regionalização", se olhasse para as áreas metropolitanas. O problema, contudo, não é o de haver ou não "áreas metropolitanas", mas antes o de saber se, na proposta de José Sócrates, as "áreas metropolitanas" são entendidas como alternativa ou como primeiro passo para a (inevitável) reforma da Administração Pública? Ou seja: se as "áreas metropolitanas" são apenas uma alternativa ou, pior, uma manobra de diversão ou, pior ainda, a "experiência" de que fala Passos Coelho, estamos mal e estamos a perder tempo. Se é um primeiro passo na direcção duma verdadeira reforma que revolucione, estamos bem. Veremos!