Hoje vamos votar! Ninguém deverá deixar de cumprir essa tarefa. O voto é, como todos sabemos, um importante direito e dever em democracia. As desilusões e indecisões bloqueiam parte dos portugueses, mas todos dispomos de elementos mínimos de análise para fazermos livremente opções de voto, mesmo que essas opções não propiciem grande entusiasmo.
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Se sentimos a democracia enfraquecida, procuremos dar-lhe impulsos de revitalização e densidade. Deixá-la tolher é um caminho bem mais perigoso. Quanta maior for a participação no voto, maior será a mobilização para as tarefas que se seguem. E o pós-eleições é um tempo de maiores exigências que o período do processo eleitoral. A democracia portuguesa pode dar, nestas eleições, relevantes sinais de vitalidade.
Amanhã de manhã, conhecidos os resultados, tudo indica que estaremos num complexo mas desafiador processo de maturação das suas interpretações, que nos há de conduzir à existência de um novo Governo (independentemente de quem o integrará), à clarificação dos compromissos político partidários que o sustentarão, à definição de políticas concretas para responder aos problemas com que o povo e o país se deparam.
Parece perspetivar-se uma composição da Assembleia da República (AR) que a colocará, positivamente, num lugar de relevo como já não tinha há muitos anos. Não tenhamos medo dos debates, do conflito de posições, da necessidade de mais negociação e da criação de compromissos novos. Para a democracia, é bom que o Parlamento seja o espaço desses desafios e objetivos. As grandes mudanças não se fazem sem práticas novas e, além disso, todos os deputados (e as forças políticas representadas) têm responsabilidade igual nos seus mandatos.
Logo à noite, poderemos assistir a alguns festejos excessivos face a resultados obtidos, como forma de esconder fracassos próprios e de deslocalizar enfoques de observação, mas também a sofrimentos autofágicos ou a atitudes típicas de automutilação. Os que instituíram a existência das "forças do arco da governação", lhes atribuíram o exclusivo de exercício do poder executivo e nos dizem que não existem alternativas vão procurar renovar e reforçar a sua argumentação e soluções. Aqueles que afirmam alternativas e não desistem de lutar por elas vão ser desafiados a dar passos inovadores que correspondam aos apelos dos cidadãos, quando estes clamam compromissos que diminuam o sofrimento do povo e gerem caminhos de esperança e desenvolvimento. Sem falsas expectativas, há que forçar novos cenários políticos: eles podem surgir de diversas formas, mesmo que a alguma distância.
Os resultados das eleições propiciarão, por certo, análises enviesadas a que é preciso dar redobrada atenção, até porque temos um presidente da República (PR) com atitudes preocupantes: muito antes dos portugueses decidirem, através do voto, o quadro dos resultados, disse: "sei como é que irei atuar"; 24 horas depois, anunciou a sua ausência - inconcebível - na evocação da implantação da República, porque tem de "se concentrar na reflexão".
Estando entre vencedores ou vencidos, logo à noite como amanhã, é preciso assumir com coragem a não desistência dos combates que aí vêm, associados à exigência de pôr de lado as políticas austeritárias, ou inerentes à batalha a travar para se eleger um PR que ouça e interprete os anseios dos portugueses.
O dia a dia de muitos portugueses é duro: alguns sentem um tal peso que são tentados a "fugir da vida", ou subjugam-se à responsabilização pelo seu infortúnio. Mas há sempre possibilidade de se criarem dinâmicas novas e força coletiva de transformação e mudança.
Durante a campanha eleitoral pintaram-se alguns cenários cor-de-rosa distantes da realidade com que nos deparamos. Forcemos respostas efetivas aos grandes problemas que continuam por resolver. E peguemos na tese eleitoralista de que a crise já passou, para exigir que os cortes nos nossos direitos e nas condições de desenvolvimento sejam tratados como transitórios, o que significa que devem ser repostos. Esses cortes não podem ser transformados em fatores de estruturação de uma sociedade mais desigual e injusta.
Hoje vamos votar!