Durante os anos em que vivi em Londres, alguns portugueses inquiriam-me sobre o modo como os britânicos olhavam a velha Aliança com Portugal.
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A questão não estava entre as que, minimamente, preocupavam quem quer que fosse, por esses tempos. O tema só surgia na retórica dos discursos oficiais ou vocalizada por britânicos que, simpaticamente, queriam um pretexto de conversa, alternativo à estafada menção ao Vinho do Porto.
Aos meus interlocutores portugueses, eu procurava dizer a verdade. E a verdade é que a generalidade dos britânicos com quem falava, além de raramente referirem esse tratado do antanho, quando o faziam colocavam-no num patamar de mera curiosidade histórica e, sem exceção, a nenhum passava pela cabeça a plausibilidade da sua menor invocação nos tempos que corriam. Um dia, numa palestra em Londres, perante uma questão sobre se ainda cria na Aliança, respondi, por entre britânicos sorrisos amarelos: "Acredito! Acredito tanto como os ingleses..."
Vale um belo livro nunca escrito o histórico das relações luso-britânicas, ao longo de séculos. Tratados, entendimentos, desencontros, perfídias, interesses comuns ou contraditórios - há um pouco de tudo. Aliás, uma pequena amostra de tudo isso guardo na minha memória profissional, fruto daquilo de que fui testemunha presencial em vários momentos.
Às vezes, diz-se que devemos aos britânicos a nossa independência. É um erro: talvez lhes devamos uma ajuda pontual à preservação histórica da nossa soberania, mas isso custou-nos, por séculos, precisamente a nossa independência, que ficou sob a sua tutela.
Para tempos recentes, fica a imagem de uma relação bilateral a que a nossa comum presença nas instituições europeias só trouxe maior distância e um crescente afastamento do padrão de interesses. Salvo no sublinhar da importância em manter a Europa num laço transatlântico forte, raramente detetei pontos de aproximação entre Londres e Lisboa, que pudessem configurar eixos de ação comum na esfera comunitária.
A decisão britânica de excluir Portugal das rotas turísticas, levantou por aí um "Mapa Cor-de-Rosa" de indignações. Com razão, protestámos, alto e bom som, para inglês ouvir. Esse tempo passou: agora, com serenidade, discutamos com eles os nossos comuns interesses.
É que já Palmerston dizia que "a Inglaterra não tem amigos, tem interesses". Às vezes, contudo, a História provou que Londres também tem interesse em ter amigos. Lembremos-lhes isso.
Embaixador