Anda comigo rever os aviões
A mera sucessão cronológica dos factos é bastante para expor o ridículo em que António Costa e Pedro Nuno Santos mergulharam o país. Mas para além das manobras político-partidárias que guiaram a estratégia futebolística do primeiro-ministro no caso dos novos aeroportos de Lisboa que nasceram a uma quarta e morreram a uma quinta ("agora é levantar a cabeça e pensar no próximo jogo" deu lugar a um "os políticos também são humanos e cometem erros" e é preciso "seguir em frente") sobra a pergunta elementar: devemos esperar este grau de amadorismo noutros dossiês complexos que o ainda tenro Governo terá de enfrentar até ao fim da legislatura? Pela amostra, temos razões para temer o pior. Porque prevaleceu o instinto de sobrevivência e soçobrou a probidade e o sentido de decência.
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Certamente que o tempo ajuda a dissipar as nuvens políticas, e a verdadeira autópsia moral desta novela mal-amanhada só será feita daqui a uns anos, num qualquer livro de memórias, mas o elefante na sala permanece vivo e estrebuchante: que solução vai apresentar o Governo para resolver uma urgência com 50 anos de atraso? Apenas os ingénuos podem acreditar que o ato de contrição de António Costa (e o de humilhação de Pedro Nuno Santos) teve como fito conceder algum ascendente ao PSD na decisão final sobre o novo (ou novos) aeroportos de Lisboa. E mesmo que Marcelo Rebelo de Sousa tenha lembrado a necessidade de um consenso alargado que vincule o regime no tempo, não é crível que Luís Montenegro, por mais que possa agora sentir-se empoderado por esta espécie de poder involuntário, vá conseguir, no congresso deste fim de semana que o vai alcandorar a líder, tirar um coelho da cartola e impor uma solução revolucionária. Os estudos técnicos já foram feitos e as consequências medidas. Só é preciso decidir politicamente. "Só".
O que sempre esteve em causa na cabeça dos protagonistas desta ópera bufa foi o PS, os equilíbrios de poder internos e a gestão dos egos, e nunca o cuidado com o pensamento do principal partido da Oposição. Ainda assim, e sem mexer um músculo, Montenegro já levantou voo sem comprar bilhete.
*Diretor-adjunto