<p>Sejamos claros: a forma como a Refer anunciou o encerramento, supostamente temporário, das linhas do Corgo e do Tâmega, alegadamente por questões de segurança, é indigno. Uma empresa pública cujos gastos são cobertos pelos impostos dos portugueses não pode dar-se ao luxo de tratar assim os seus clientes, avisando-os de supetão da perda daquele serviço. Sobretudo os clientes da região Norte, que nas últimas duas décadas viram desaparecer 402 quilómetros de vias-férreas.</p>
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Os responsáveis da Refer e a secretária de Estados dos Transportes, que tutela a empresa, explicaram-nos que o estados das linhas era, em termos de segurança, "preocupante". Logo, só haveria uma saída: encerrá-las. Mais uma vez tentaram levar-nos por tolos. É óbvio que se os troços constituem algum perigo têm que ser fechados.
Sucede que não é esse o ponto. O ponto é que Refere e a governante sabiam há muito dos perigos - e mesmo assim decidiram informar a população de um dia para o outro. Prova disso mesmo: no dia seguinte ao anúncio do fecho, atiraram-se 40 milhões de euros para cima do problema. Ora, estando esse investimento decidido há muito, a única coisa séria a fazer era dar notícia do encerramento das linhas atempadamente.
A táctica nem sequer é nova. Há uns anos, a CP substituiu as locomotivas da linha do Douro por locomotoras antigas, mudou horários sem dar cavaco a ninguém e acabou com o intercidades. A população protestou, os autarcas calaram-se. Maltratando e desprezando os transmontanos e os alto durienses, a CP conseguiu o que queria. Parabéns.
Dito isto é preciso dizer outra coisa. Manter linhas com pouca procura tem um custo, por vezes elevado. E, para ser totalmente correcto na análise deste intrincado problema, temos de responder a esta questão: estamos dispostos a arcar com esses custos? Respondo por mim: eu estou. Por uma prosaica razão: eu quero que o potencial turístico, económico e cultural das linhas se mantenha o mais intacto possível, porque acredito que, neste mundo globalizado, quem tem a sorte de poder oferecer exclusividade tem nas mãos um trunfo de gigante valia. Não há muitos rios no Mundo com as ímpares características do Sabor. Não há muitos sítios no Mundo com a beleza do Douro Internacional...
Acredito também que os pequenos episódios de regresso de famílias inteiras ao interior do País, ou da mera opção de ali construir uma nova vida, tendem a multiplicar-se, por um número de razões que não interessa agora invocar. E o transporte ferroviário terá aí um papel fulcral.
O assunto é sério. E é por isso que não pode passar impune a forma despudorada como a Refer e o Governo tendem a tratá-lo.