Na amálgama deslizante em que nos tornamos, passageiros indo do comboio para a rua em hora de ponta, sigo atrás de três raparigas. Duas escutam a terceira, referindo-se esta a uma ausente e detestada quarta: “Aquela porca manjericona!...”
Experimentem dizer em voz alta e verão que a coisa funciona. A fêmea de suíno não surpreende, trata-se de um insulto comum, mas o género feminino da planta aromática a que os italianos chamam “basilico” e dão melhor uso, embora não exista, soa facilmente a ofensa (em particular se “porca”), devido à incontornável sugestão do vulgarismo indicador da genitália feminina. Manjerona, outra erva aromática, também rimaria, mas o impacto seria francamente menor.
Numa ulterior reflexão sobre esta candente problemática, recordei a figura icónica do capitão Haddock, companheiro em tantas aventuras de Tintin. Marinheiro de língua solta, o capitão insultava com vigor, quando era caso disso, mas sobretudo com inigualável originalidade, usando palavras de significado nada insultuoso, mas em medonho e retumbante registo vocal (sugerido graficamente aos leitores). Alguns exemplos: “Anacoluto!” (nome de uma figura de estilo); “ectoplasma!” (termo usado tanto na biologia como na parapsicologia); ou, mostremos agora uma expressão em francês, “moule a gaufres!” (o utensílio/forma usado para fazer “waffles”). Há centenas de insultos do género, inventados por Hergé, e dicionários dedicados ao tema.
“Insultai-vos uns aos outros” não é uma norma de conduta que aqui queiramos promover, mas chamar “ostrogodo” ou “flebótomo” a alguém que não apreciamos, usando o tom adequado, pode ser libertador ou, pelo menos, divertido. É sempre possível encontrar, até nos momentos mais negros, aquele pormenor risível que facilita a nossa sobrevivência.
Hoje é empossado o “novo” presidente dos Estados Unidos, pelo que a crónica tem como destinatários os nossos leitores do Canadá, da Gronelândia ou do Panamá. Ao meio-dia (Eastern Standard Time, mais cinco horas em Portugal Continental), virem-se na direção de Washington D. C. e gritem: “Cataplasma!”, “scolopendra!” ou “logaritmo!”. Sentirão o alívio. E o remate pode ser em francês: “Mille millions de mille milliards de mille sabords de tonnerre de Brest!”.

