Existe uma inevitável diferença entre a letra e a interpretação concreta de princípios e valores normativos, em todos os campos da vida. É natural que isso mesmo aconteça na prática religiosa, em que tantas vezes o deus dos monoteístas é invocado quando tudo em volta expõe a sua total ausência. Ainda assim, a aspiração de quem professa uma fé é a coerência entre a palavra e a ação. Hoje, dia em que tantos dos nossos políticos irão à missa do galo, acredita-se que esse ato não é despido de vontade de seguir as orientações da doutrina social da Igreja. A título de lembrete, evoco algumas. Quem tem responsabilidades políticas está obrigado a interpretar o bem comum na perspetiva de todos os membros da comunidade, "inclusive dos que estão em posição de minoria". Até porque o princípio da destinação universal dos bens (que pressupõe que a propriedade individual não é absoluta) requer que se cuide "com particular solicitude dos pobres, daqueles que se acham em posição de marginalidade", das "imensas multidões de famintos, de mendigos, de sem-teto, sem assistência médica e, sobretudo, sem esperança de um futuro melhor". No plano laboral, o pensamento social da Igreja (que ganhou corpo em resultado das revoluções industrial e liberais contemporâneas) reconhece a legitimidade da greve e a importância dos sindicatos e alerta para a exposição dos trabalhadores "ao risco de ser explorados pelas engrenagens da economia e pela busca desenfreada de produtividade". Sublinha ainda que o desenvolvimento global desequilibrado obriga tantos a procurar emprego longe do seu país, contribuindo para o desenvolvimento das economias de destino. "Os imigrantes devem ser acolhidos enquanto pessoas e ajudados, junto com as suas famílias, a integrar-se na vida social", razão para se respeitar e promover "o direito a ver reunida a família". O Menino, no presépio, está sempre de braços abertos. Abertos para o Mundo, para a diferença, para os mais pequenos e escorraçados.
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