O primeiro-ministro elegeu a saúde como tema da sua mensagem de Natal. Fez bem. Porque o SNS carece de uma reforma estrutural e o poder político não pode adiar mais uma intervenção de fundo aí, sob pena de ver colapsar uma das principais conquistas da nossa democracia.
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Numa curta intervenção, António Costa esqueceu um elemento: a necessidade de intensificar a humanização dos serviços. Que não se traduz em medidas quantitativas, mas é determinante para a qualidade dos serviços prestados.
Os últimos tempos não têm sido fáceis para o Governo em matéria de saúde. Ordens profissionais, sindicatos, partidos políticos e média noticiosos concentraram aí a sua atenção, numa crítica musculada às políticas públicas desse campo. A ministra Marta Temido tem resistido, embora sempre lhe tenham faltado recursos financeiros para enfrentar tantas carências. O próximo Orçamento do Estado procurará neutralizar parte dessas dificuldades. Na sua mensagem de Natal, o PM garantiu mais investimento em infraestruturas e equipamentos, a contratação de 8400 novos profissionais, o pagamento de incentivos para reduzir listas de espera, mais camas para cuidados continuados, a eliminação faseada das taxas moderadoras... Não se poderá criticar o Governo por inação, mas os serviços de Saúde precisam de políticas alargadas à promoção de uma maior humanização e de uma comunicação mais eficaz a diversos níveis no que à saúde diz respeito.
É verdade que a atual titular da pasta da Saúde tem introduzido nos seus discursos a urgência de humanizar não só os cuidados hospitalares, mas também outros cuidados, desde os primários aos de reabilitação. No entanto, não chega enunciar boas intenções. É urgente desenvolver políticas efetivas. Que aproximem os profissionais de saúde dos doentes. Muitas vezes tão importante como tratar clinicamente o doente é saber ampará-lo num momento de aflição. Talvez tenhamos esquecido muitos médicos ou enfermeiros que trataram as nossas doenças, mas decerto que fixamos para sempre aqueles que se preocuparam em cuidar bem de nós... Também é impreterível ajudar os profissionais de saúde a comunicar melhor entre si e com os pacientes que tratam. Hoje, os utentes são mais exigentes e mais críticos. E isso implica outras interações. Que devem ser promovidas logo na formação dos profissionais.
Não chega injetar dinheiro no setor da Saúde. O Governo não pode esquecer que, sem humanizar serviços e ajudar a criar outra comunicação neste campo, qualquer reforma, mesmo que bem ancorada financeiramente, não triunfará.
*Professora Associada com Agregação da Universidade do Minho