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Corrupção. Assim, sem papas na língua, começa e acaba o episódio do "Panorama BBC" dedicado à mulher mais rica de África. Um ferrete que seguramente causará mais dano a Isabel dos Santos do que qualquer julgamento ou condenação num tribunal. A própria já demonstrou estar mais preocupada com a investigação jornalística (anunciou um processo ao consórcio) do que com a justiça angolana (país a que provavelmente não regressará).
Os muitos adeptos dos nossos chavões caseiros - "à justiça o que é da justiça" ou "inocente até ao trânsito em julgado" - devem ficar com os cabelos em pé com semelhante desplante da BBC. Nem tanto por causa de Isabel dos Santos, que agora é como se tivesse lepra, antes porque muitos dos nossos respeitáveis políticos, advogados, consultores ou empresários também participaram e beneficiaram dos negócios que agora se classificam como "corrupção", sem esperar por sentença lavrada por um juiz de toga. Naturalmente, nunca lhes passou pela cabeça, aos nossos empreendedores, ou a qualquer ex-político com boa agenda de contactos e gosto por diamantes, que conceitos como oligarquia e nepotismo sejam gémeos, e muito menos que ambos estejam casados, em união de facto, com a corrupção.
É parecido com o que se foi passando durante anos com o BES, agora Novo Banco. As intenções eram boas, as oportunidades de negócio excelentes, os milhões emprestados tinham retorno garantido. Ou não, como confirma o mais recente calote: 375 milhões de Bernardo Moniz da Maia. Ainda assim, não foi de propósito e o empresário até entregou, ainda que à força de penhora, o iate e o avião privado. É castigo suficiente.
Já para os piratas que andam a colocar areia na engrenagem do ecossistema dos negócios (seja na banca, no petróleo ou na bola), qualquer castigo é pequeno. Como toda a gente, Rui Pinto será "inocente até ao trânsito em julgado". Mas, enquanto espera, fica na cadeia a cumprir pena. Ao contrário de Isabel dos Santos e dos seus muitos parceiros neste belo cantinho à beira-mar plantado. Aqui não há oligarquias, nepotismo e muito menos corrupção.
*Chefe de Redação