A preservada Vespa que transporta, sempre que a meteorologia o permite, Pedro Mota Soares entre a sua casa e o Ministério da Segurança Social há de sentir, por estes dias, o peso superior ao normal que o governante carrega, fruto das preocupações que o apoquentam.
Corpo do artigo
Ontem, a Vespa há de ter sentido um peso ainda mais inusitado: os brutais dados do desemprego registado no primeiro trimestre deste ano são uma espécie de bola de ferro que, depois de atingir quem perde o trabalho, atinge as contas da Segurança Social - e, por essa via, puxa para baixo a sacrossanta execução orçamental.
Este é o contexto: há, oficialmente, um milhão e vinte e uma mil pessoas desempregadas (819 mil contabilizadas pelo Instituto Nacional de Estatística mais 202 mil que foram consideradas inativas, estando embora disponíveis para trabalhar). É uma brutalidade, um rolo compressor para milhares de famílias, uma gigante bola de ferro que destrói tudo o que apanha pela frente. Contas feitas, a cada dia que passa mais meio milhar de portugueses ficam desempregados.
O ministro do Emprego, o inefável Álvaro, olhará para o drama com a bonomia habitual. Ele acredita que a crise está pertinho do fim, pelo que o problema se resolverá antes que o diabo esfregue um olho. O Banco de Portugal e os malfeitores da troika entendem, ao invés, que o desemprego em Portugal está a crescer a um ritmo superior àquele que seria expectável, face ao curso da atividade económica. Estarão enganados, certamente. É falar com o ministro da Economia para perceber como, afinal, o que parece não é.
A bola de ferro do desemprego chega numa altura em que o bom comportamento das exportações e o andamento, menos mau do que o previsto, da economia pareciam trazer pequenos sinais de ânimo. A verdade é que a tragédia não para de crescer, com as consequências conhecidas.
Como pode ler-se esta aparente contradição?
O duríssimo ajustamento a que a economia portuguesa está a ser exposta e a inevitável inversão do modelo económico estão a matar de vez as empresas que, por esta ou aquela razão, não foram capazes de se ajustar, como agora se diz. Há setores inteiros, como a restauração e bebidas, que jamais recuperarão deste tremendo embate. O que significa que não regressaremos aos tempos em que o desemprego se ficava pelos 4% ou 5%, como nos governos de António Guterres.
Uma crise, como diria o filósofo Antonio Gramsci, é o ponto em que "o velho já morreu e o que é novo não consegue nascer". Uma coisa parece certa: quando "o novo" conseguir nascer não trará consigo as certezas do passado. Salvar-se-á mais depressa quem mais depressa perceber que acabou o tempo das flautas mágicas. As bolas de ferro estão aí para o provar.