Corpo do artigo
A vida política envolve decisões tão marcantes que estabelecem padrões de conduta para décadas, manuais de procedimento usados e abusados sempre que o quadro é passível de encontrar paralelo num outro tempo ou conjuntura. Quando, em 2001, o então ministro do Equipamento Social do Governo socialista, Jorge Coelho, se demitiu na sequência da tragédia de Entre-os-Rios, onde o colapso da Ponte Hintze Ribeiro custou a vida a 59 pessoas, estabeleceu uma escala de coerência e seriedade que haveria de marcar as gerações futuras. Da mesma forma, Carlos Moedas, presidente da Câmara de Lisboa, acaba de fazer o mesmo, só que no campo da incoerência. Mas já lá vamos. Parece-me relevante esclarecer que, no plano teórico, entendo que o autarca não deve ceder à pressão. Pelo menos, por agora. É necessário manter-se no cargo, garantir todo o apoio a vítimas e famílias, contribuir para o esclarecimento célere do que se passou com o Elevador da Glória, e só então, apuradas as responsabilidades, estaremos em condições de perceber se se justifica o seu afastamento. Sem precipitações, até para não acontecer o mesmo que a Jorge Coelho, porque nas conclusões de Entre-os-Rios a culpa acabaria endossada à tutela do Ambiente. O problema é que este Carlos Moedas é o mesmo que sugeriu a saída de Fernando Medina da Câmara de Lisboa no caso da partilha dos dados de residentes anti-Putin com o Governo russo. Por isso, à semelhança de Jorge Coelho, mas com pressupostos éticos menos abonatórios, o autarca lisboeta acaba de cravar uma nova bitola na política portuguesa: a da incoerência.