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O muito recomendável restaurante Velhos Tempos, em Braga, tem na entrada uma série de velhos adágios cravados em antigos azulejos. Lê-se num deles: "As mulheres, quando se juntam a falar da vida alheia, começam na lua nova e acabam na lua cheia". Não são apenas as mulheres: o Partido Socialista também tem a verborreia inconsequente no seu ADN. Mesmo quando a discussão é sobre a vida interna do partido, a conversa começa na lua nova e acaba na lua cheia.
Claro: a discussão eterniza-se tanto mais quanto maior for a divisão entre as hostes. E, nesta altura, a divisão é grande e tende a crescer. Porquê? Porque, muito simplesmente, António José Seguro não entusiasma (quase) ninguém. Não entusiasma uma parte dos autarcas que ajudaram a elegê-lo. Não entusiasma as gradas figuras do PS que sentem o cheiro do Poder a dissipar-se no ar. Não entusiasma, enfim, o indígena anónimo, que não vê em António José um porto seguro. Bem vistas as coisas, é extraordinário que, numa conjuntura extremamente adversa para o Governo, o principal partido da Oposição não consiga descolar. Digamos que é necessária uma certa falta de jeito para permitir que as coisas estejam como estão.
E como estão as coisas no PS? Estão sem retorno. O avanço de António Costa não foi um fogacho - foi um abanão. A melhor prova disso mesmo é o facto de os socialistas terem entrado para a reunião de anteontem trocando acusações de deslealdade e terem de lá saído aos beijos e abraços. Ora, a unidade de um partido não se constrói com palmadinhas nas costas e cumprimentos de circunstância. Constrói-se com ideias e projetos. E as ideias e projetos de Costa e Seguro estão muito distantes.
É quase risível ouvir dirigentes do PS dizer, findo o conclave, que, agora sim, o partido vai unir-se. Seguro teve quase dois anos para juntar as pontas. Não conseguiu. Vai fazê-lo agora num meteórico espaço de três semanas? Não consta que o líder do PS seja o Super-Homem da política, capaz de enfrentar todos os perigos em tempo recorde e, ainda, dotar--se de uma carapaça que o proteja dos adversários.
Alguns conseguiram mesmo vislumbrar no desfecho do encontro uma vitória de Seguro, por ter obrigado Costa a recuar. Trata-se, quando muito, de uma vitória de Pirro. António Costa deu um passo atrás para a seguir dar dois em frente. A única coisa que falta saber é quando os dará. Talvez quando a lua nova der lugar à lua cheia.
Entretanto, o Governo agradece gentilmente o favor prestado pelo PS. O país, esse, mantém-se triste.
P.S.: A escolha do candidato do PSD à Câmara de Vila Nova de Gaia só podia acabar como acabou. Isto é: mal. Quando aqui qualifiquei, há uns dias, os putativos sucessores de Menezes, a azia tomou conta de alguns estômagos. Estava na cara: nenhum dava garantias de unidade. Antes pelo contrário: todos apontavam para o esfrangalhar da Concelhia. O que aí vem não será, seguramente, bonito. A azia ameaça provocar úlceras.