Na sequência de um abaixo-assinado organizado por moradores, este jornal noticiou num tom alarmista os problemas alegadamente causados pela descarga de estilha de madeira em Leixões.
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É natural que quem vive próximo de um porto se insurja contra os incómodos que ele lhe causa, e procure atrair atenção mediática para sustentar as suas reclamações. O ruído e as poeiras causadas pela movimentação das cargas, as gaivotas que são atraídas pelo porto de pesca, os cheiros, e tudo o mais que rodeia a faina marítima, causarão sempre algum desconforto.
Mas, a verdade é que quem escolhe uma morada sabe - ou deve saber - que existem ónus de proximidade, e não pode exigir que, em razão desse desconforto, a actividade portuária deixe de existir, tal como quem vive junto à praia não pode obrigar à remoção das areias que em tempos de vento se levantam, ou quem vive junto a uma floresta não pode impor o arranque das árvores só porque elas significam um risco acrescido de incêndio.
Dito isto, e supondo o cumprimento das normas legais, é possível com o bom senso de todos os intervenientes encontrar formas de convivência entre o domínio privado e o interesse público. A APDL é sensível a essa questão e tem-se empenhado numa política de boa vizinhança com a cidade envolvente, investindo no embelezamento da zona portuária, desenvolvendo acções em prol da comunidade e preocupando-se com as questões ambientais. É um tema que conheço porque presidi à Comunidade Portuária que congrega os diversos agentes e entidades envolvidas na actividade do porto tendo, por isso, acompanhado as preocupações da APDL relativamente à questão ambiental. Aliás, Leixões foi o primeiro porto europeu a publicar um relatório de sustentabilidade.
Ora, o caso da estilha, constituindo um incómodo, está longe de ter os contornos dramáticos que foram invocados porque não é um caso de saúde pública, como é demonstrado pelas medições de partículas. Além do mais, é um problema recente, já que as descargas destas aparas destinadas às celuloses e que ficam temporariamente armazenadas no cais começaram no início do ano, tiveram a sua maior concentração em Maio e uma primeira solução provisória em Junho. Nessa altura, a APDL colocou uma rede de protecção sobre a barreira de contentores que delimita a área de parqueamento e antes do fim do ano haverá uma solução definitiva, que está a ser desenvolvida pela Universidade de Aveiro, e que impedirá a propagação de partículas através de uma rede metálica que fará a protecção lateral e poderá cobrir a duna de aparas.
Acresce que a estilha de madeira é uma matéria- -prima inócua que se destina a um dos mais relevantes sectores da exportação nacional, gerando riqueza e dando trabalho a muita gente. E, sendo certo que tudo deve ser feito para reduzir os incómodos às populações dentro dos limites técnicos e económicos e num prazo razoável e exequível, também é verdade que o país não está em condições de fazer sacrifícios desnecessários. Em matéria de bom senso, que nesta, como noutras matérias, sempre se exige, há que louvar neste caso a firmeza da Administração do porto que resistiu à tentação e ao facilitismo, sendo certo que, ao não ceder à pressão, e ao não interromper as descargas, ponderando devidamente as consequências que uma tal decisão envolveria para a economia nacional, perdeu seguramente a hipótese de constar da galeria dos nossos heróis populares como mais um dos que se vão tornando bem vistos aos olhos de todos pela via da adopção sem reservas da solução mais demagógica e mais bem querida.