Corpo do artigo
Levante o dedo quem não ouviu um político, um empresário ou um cidadão mais ou menos informado sublinhar a importância das exportações para o futuro do país. Não se vêem dedos no horizonte... É na venda dos nossos produtos ao exterior que está, isso é claro, a almofada primeira da crise que nos entrou pela porta adentro sem pedir licença. Sem investimento e sem consumo público e privado, não há volta a dar à coisa! Ocorre que, como se verá de seguida, as exportações não são, tristemente, a panaceia para o gravíssimo problema português. Quer dizer: convém que, não as descurando, continuemos a olhar para as outras variáveis da nossa complexa equação.
O Instituto Nacional de Estatística (INE) atirou-nos ontem com estes números: comparados Dezembro de 2010 com Dezembro de 2011, as exportações deram um trambolhão de 15,4 por cento (uma enormidade!), sobretudo no comércio com o resto da Europa (a nossa principal cliente, com a periclitante Espanha em destaque), mas também no extracomunitário (menos 6,4 por cento).
É um sinal que não espanta os mais atentos. Mais: é um sinal esperado, na exacta medida em que o andamento das economias dos nossos parceiros europeus está como está: sofrível.
Como contornar o problema?
O sector do calçado talvez sirva de exemplo. Também ontem, a associação do sector fez saber que as exportações subiram, em 2011, 16%. É notável, sobretudo porque os empresários contavam, a meio do ano, com um crescimento abaixo dos 10%. De Janeiro a Dezembro, o sector colocou no exterior 95% da sua produção (o equivalente a mais 75 milhões de pares) e chegou mesmo a mais de 130 países nos cinco continentes. Notável, outra vez.
É um milagre? É - é o milagre da multiplicação do trabalho, da insistência e da definição de uma estratégia com cabeça, tronco e membros, exactamente o que falta noutros sectores.
Os empresários andam nas feiras internacionais há 20 anos (são teimosos, ou resilientes, como agora se diz). Perceberam a tempo que não sairiam da cepa torta caso combatessem pelo preço. E, assim sendo, combateram pelo lado que sobrava: criaram marcas próprias, incorporaram qualidade no produto (isto é: elevaram a cadeia de valor), passaram a responder com eficácia e rapidez às encomendas de quem procura bom calçado, assumiram que o grau de exigência tem de estar cada vez mais alto... E, com tudo isto e o apoio de uma associação (APICCAPS) que sabe estar ao lado dos seus, passaram a estar na moda. As multinacionais partiram - e o sector do calçado resistiu.
Claro: o resultado de 2011, será, porventura, difícil de repetir nos anos que aí vêm, pelas razões conhecidas. Estou em crer que, para os empresários do calçado, essa perspectiva não lhes atrapalha o ânimo e a vontade de contrariar o que parece, à partida, impossível de contrariar. É gente de antes quebrar que torcer. É gente que acha que tudo vale a pena quando a alma não é pequena.