Esta e as próxima semanas serão, porventura, das mais decisivas da política portuguesa das últimas décadas. Esta é a semana em que o Governo apresentará o Orçamento do Estado (OE). Esta é a semana em que, conhecida a proposta, o PSD dirá, definitivamente, se a reiterada ameaça de chumbar o OE é, ou não, para levar até ao fim, independentemente das consequências. A próxima será a semana em que acontecerá uma de duas coisas: ou país mergulha no caos político, caso o PSD cumpra com a palavra dada aos portugueses; ou o país manterá a cabeça à tona da água, sem saber, realmente, se terá força e capacidade para, sozinho, ir emergindo aos pouqinhos.
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Verdade: entre as duas possibilidades, não parece difícil escolher a segunda. Verdade aparente: nada, mas mesmo nada, nos garante que, escolhendo a segunda, escapemos, daqui a uns meses, ao caos. Basta que o pesadíssimo rasto económico e finaceiro do país não dê sinais de inversão, mesmo com planos de austeridade mais ou menos gravosos, mais ou menos severos. É por isso que consigo entender a posição de Passos Coelho (com alguma dose de bonomia, é certo, uma vez que é preciso descontar a elevada fracção do mero cálculo político e da pressa em chegar ao Poder). Um dia, isto tem de parar. Um dia, alguém tem de ser suficientemente corajoso para fazer um corte com as loucuras acumuladas ao longo de anos de desgoverno.
Sucede que este não é o momento para tais bravuras. Há mais de um mês, quando Cavaco Silva começou com maior insistência a chamar Sócrates e Passos Coelho à pedra, entendi que o país se podia dar ao luxo de rejeitar um mau OE. Já não penso assim. As circunstâncias alteraram-se radicalmente: o (novo) plano de austeridade é a prova cabal do estado comatoso das nossas finanças. Por isso, é hoje nítido que, caso o OE não passe, a falta de liderança política descambará com muita rapidez numa espiral de desconfiança dos mercados financeiros que acabará como todos sabemos: com a intervenção de uma entidade externa. Tradução: acabará com um atestado de menoridade assinado pelas nossas mãos e com o agravamento, para muitos insustentável, das condições de vida.
A discussão política sobre os ganhos e perdas, para o PS e o PSD, para Sócrates e para Passos Coelho, da estratégia tipo mata-mata escolhida pelas partes é muito interessante. Mas apenas do ponto de vista teórico. O que está hoje em causa é saber se Passos Coelho está diposto a "queimar" a alma para salvar o país, optando pela responsabilidade. Ou se prefere deixar "arder" o país, optando pela convicção.
Horas difíceis, as que seguem...