<p>Os socialistas, que criticaram a entrevista de Passos Coelho a um jornal estrangeiro, tiveram muita dificuldade em justificar o impacto que a entrevista de Teixeira dos Santos ao "Financial Times" - em que recorreu a uma parábola futebolística para admitir que Portugal está a ser arrastado para o abismo - teve nos juros da dívida pública. Infelizmente, mesmo que os nossos governantes e dirigentes políticos recusassem falar a jornais ou a televisões estrangeiras, tudo continuaria na mesma. Basta ver como a entrevista do Ministro dos Negócios Estrangeiros ao "Expresso", em que admite a saída do Euro, teve igual repercussão fora de portas.</p>
Corpo do artigo
O problema de Portugal não é de marketing político mas de sustentabilidade, porque todos os dias compra mais do que aquilo que vende e porque tem um Estado voraz, que os cidadãos reclamam, mas que já não conseguem pagar com a riqueza que criam. É essa circunstância que ameaça o regime, porque o garantismo que foi prometido aos eleitores, e que condicionou os comportamentos das últimas duas gerações, transformou-se, com o tempo, numa equação irresolúvel. Aquilo que os portugueses tentam ignorar, adiando reformas e sacrifícios inevitáveis, é óbvio para quem nos olha a partir do exterior, de forma descomprometida, desapaixonada e desinteressada. É este contexto, e não qualquer conspiração, que influencia os juros da nossa dívida pública. Numa altura em que há carência de liquidez nos mercados, e em que as nações concorrem entre si para se financiarem, é normal que um país como o nosso tenha de pagar muito caro para atrair esses recursos, mais a mais quando os nossos parceiros europeus se recusam a avalizar a nossa solvabilidade.
Ora, a grande questão que se coloca aos líderes desses nossos parceiros, e com a qual não podemos deixar de os confrontar, é a sobrevivência do ideal europeu, de que a coesão solidária da Zona Euro é uma peça fundamental. Os países que promoveram a criação da moeda única, e que aderiram a um espaço de co-responsabilidade e interdependência, acreditaram numa utopia: pensaram que seria possível ter uma moeda única para economias tão díspares como a alemã e a portuguesa, sem introduzir um mecanismo de reequilíbrio, ou seja, ousaram dispensar um orçamento federal que asseguraria o equilíbrio da moeda, através do princípio dos vasos comunicantes.
Nesta circunstância, aquilo que os PIIGS lhes devem demonstrar é que o colapso das economias periféricas do Euro acarretará a decadência de toda a União Europeia e o fracasso do ideal europeu. Não sendo uma tarefa ao alcance de Portugal, a verdade é que a esse nível o nosso país tem tantas responsabilidades como qualquer outro, e conta a seu favor com uma tradição mundividente de boa diplomacia. Por isso, para além das reformas domésticas que urge fazer, enquanto a nossa sociedade as consente em liberdade, precisaríamos de ter políticos com uma visão do Mundo que pudessem exercer esse protagonismo e ajudar a influenciar a Europa dos ricos. Tudo estará perdido, em Portugal e na Europa, se o eixo Paris-Berlim continuar obcecado com a sua aparente auto-suficiência, esquecendo que o reforço da coesão é a única forma de garantir que a Europa continuará a ter a dimensão política e económica que lhe garantem um papel de relevo a nível global. Se, pelo contrário, a Europa se desagregar, e considerando o actual clima de egoísmo nacional que se vive, não é impensável que se repitam as tragédias do século passado que, também elas, tiveram a sua origem em sucessivos erros de cálculo.