Manuel Alegre e Jerónimo de Sousa, dois benfiquistas confessos, estarão, certamente, muito satisfeitos com o desempenho que a sua equipa de coração tem vindo a ter. Não correremos grande risco se anteciparmos que concordam com os que imputam a melhoria evidenciada ao treinador, por um lado, e à qualidade dos jogadores que tem sabido recrutar. Para isso, teve de escolher bem e pagar melhor. Ou vice-versa. Perante os resultados ninguém discute quanto se gastou ou quanto se paga. Todo o cêntimo é dado por bem empregado.
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Para o nível médio de remunerações praticado em Portugal, qualquer um desses jogadores ganha muito. Muitíssimo. Talvez não saibam. Bem acima do que ganha a generalidade dos gestores de topo da maioria das empresas portuguesas.
Por mais fanáticos que sejamos pela nossa equipa de futebol, todos sabemos que podemos viver sem ela. E sem electricidade, telecomunicações, estradas, combustíveis, caminhos-de-ferro, comércio, habitações ou dinheiro? Quando protestam contra os ordenados faustosos, Manuel Alegre ou Jerónimo de Sousa protestam contra quem? Os jogadores ou treinadores de futebol? Nada disso. O que eles ganham é, aparentemente, justo. Já o que recebem os gestores de empresas vitais para a nossa economia, e para o nosso dia-a-dia, isso é, obviamente, demais. Um escândalo. Nomeadamente se forem empresas públicas.
Se o Benfica decidisse reduzir o que paga os jogadores para metade o que aconteceria? Não deixaria de ter uma equipa de futebol. Os jogadores seriam mais fracos e, com muita probabilidade, não ganharia nada. Estamos todos de acordo. Isto que parece uma evidência, deixa de o ser quando passamos para as empresas "normais". Achamos escandaloso que o administrador de uma empresa ganhe trinta ou quarenta vezes mais do que o funcionário de base, mas não que um tratador de relva receba cem vezes menos do que um treinador ou jogador razoável. Sabemos que não poderemos ter uma equipa ganhadora se não contratarmos bons jogadores e lhe pagarmos adequadamente. Mas achamos que uma empresa pode ser bem gerida por qualquer pessoa, que as competências e habilitações não fazem diferença e que os ordenados são irrelevantes.
Equipas com jogadores maus e mal treinadas, não apresentam resultados. No futebol, tal como nas empresas, sejam estas privadas ou públicas. O presidente do clube querer fazer a equipa, ou dar a táctica, equivale ao governo imiscuir-se na gestão das empresas públicas. Normalmente acaba mal. Já que não se quer aprender com a história, talvez o futebol possa ser uma lição.